Cardo FlorPoema de Luiz Martins da Silva. Foto de Chico Sant’Anna

 

O que menos olhos veem

São as lágrimas que pingam,

Tão próximas do milagre

Da alegria líquida.

 

Nenhuma tristeza se salva

Se a ninguém comover.

Ou, se convir, salina, suar de pobre

Na alvura de um Cristo fractal.

 

Eu era menino e já sabia

Da improbabilidade da virgindade,

Mesmo, assim, pura Maria,

Santa, negra retinta, ébano afim.

 

A cafezeira na estação do trem

E seu brazeiro-lata-de-querozene.

Ela me dava de presente caixinhas

Cheias de sentido, vazias de palitos.

 

Ela acreditava distrair o homem

Que já franzia a criança no futuro.

Eis-me, hoje, no escuro das lembranças

Cheios de tochas, antes do alvorecer.

 

Oh! Minha madrinha postiça,

De meiguice ainda pródiga.

A criança de hoje agradece,

Cardo tardio, humilde prece.

 

Aonde estarás, reencarnada?

Quem sabe na flor-de-espinho,

Quando meu corpinho magro

Procura no céu sinal de pingo!

 

Seca para o nordestino é flagelo

Que enlaça os mais estranhos elos.

Descobre-se, não há sinônimo para lágrima,

A não ser terra seca e falta de água.

 

A flor sem grife, órfã da botânica,

Brotando nos quintais ainda insiste.

É a distância, bem aqui, irmã

Em raízes que jamais se arrancam.