O trajeto de 60 km da linha da antiga RFFSA, desde Luziânia, atende aos principais polos habitacionais da parte Sul do DF e Entorno. Seria beneficiada uma população superior a 500 mil habitantes. A linha, hoje é usada só por cargas. No sertão cearense isso já foi feito, Lá surgiu o VLT do Cariri.

 

Por Chico Sant’Anna

 

A recente crise provocada pela greve dos camioneiros revelou com todas as nuances a dependência das cidades brasileiras do transporte rodoviário, seja ele de carga ou passageiros. O atrelamento de Brasília aos carros particulares é ainda mais gritante. Não por menos, numa cidade de três milhões de habitantes, os automóveis aqui registrados ultrapassaram a casa de 1,7 milhão de veículos.

Brasília é a terceira cidade do Brasil em população. São Paulo e Rio de Janeiro, que estão à frente, possuem pluralidade maior de modais – nome chique que os técnicos dão aos diferentes tipos de transporte. Nessas capitais, é maior a quantidade de ônibus e as redes de metrô, trem regional e mesmo de ciclovias se apresentam em melhor qualidade e maior quantidade.

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Passou da hora de investir nos transportes sobre trilhos no DF. Desde o governo Arruda, a cidade desperdiçou oportunidades de custeio para a ampliação da rede de metrô. Em 2009, por meio do chamado Plano de Aceleração do Crescimento – PAC foram ofertados os recursos suficientes para levar o metrô até o Setor O, na Ceilândia e a Expansão de Samambaia, além de fazer chegar à Asa Norte, com uma estação próxima ao HRAN.

Os recursos alocados também bancariam a primeira etapa do VLT, ligando o aeroporto à estação Asa Sul do Metrô. Numa segunda etapa, entraria pela W.3. Ao todo, R$ 1,2 bilhão, que foram reafirmados pelo PAC da Mobilidade e depois Pelo PAC da Copa. Passaram-se os governos Arruda, Rosso, Agnelo e Rollemberg e nenhum centímetro de trilho foi colocado. Com a queda de Dilma, Temer acabou com a disponibilidade da verba e ficamos a pé.

Projeto original do metrô-DF previa três linhas. Em 2007, uma quarta linha para Sobradinho e Planaltina foi desenhada. Mas a opção foi transformar as novas linhas em linhas de ônibus.

Metrô do Gama

Nos anos 1990, (veja mapa ao lado) três linhas de metrô foram projetadas pelo GDF. A atual – chegando até o final da Asa Norte -, uma ligando Ceilândia ao Gama e outra partindo do Gama, pela via EPIA, chegando à Rodoferroviária.

A Cia do Metrô chegou a ter os recursos para tal obra, mas o governo Agnelo optou em usá-los para construir o BRT-Sul, ligando Santa Maria e Gama ao Plano Piloto. Deve ter sido a primeira obra no mundo de uma linha de ônibus construída por uma empresa de Metrô.

O projeto do BRT-Sul ficou incompleto. Faltou o trecho entre o Núcleo Bandeirante e a Estação Asa Sul do Metrô, passando pela Candangolândia e Park Sul. Na Candangolândia restou apenas as ruínas de uma estação inacabado que hoje abriga moradores de rua. Foto de Eugênio Josino.

O projeto do BRT-Sul ficou incompleto. Faltou o trecho entre o Núcleo Bandeirante e a Estação Asa Sul do Metrô, passando pela Candangolândia e o Park Sul. Na Candangolândia, restou apenas as ruínas de uma estação inacabada e que hoje abriga moradores de rua.

Em 2013, a placa oficial apontava um custo da obra do BRT de R$ 533,6 milhões. O custo final foi de R$ 704,7 milhões. Foto de Chico Sant’Anna.

Orçada inicialmente em R$ 587,4 milhões (Esse é o valor que as autoridades trabalham, embora placa oficial da obra apontasse em 2013 para um valor de R$ 533,6 milhões), a obra saiu por R$ 704,7 milhões, com um superfaturamento de 25%, aproximadamente R$ 208 milhões, segundo o Ministério Público. O BRT-Sul, como o Mané Garrincha, caiu na Operação Panatenaico da Polícia Federal. E a linha 2 do Metrô não saiu do papel.

Publicada originalmente na coluna BRASÍLIA, POR CHICO SANT’ANNA, no semanário Brasília Capital.

Trem Regional

Na mesma época em que se iniciavam as obras do BRT-Sul, a Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste – Sudeco apresentou projeto de transformação da linha férrea da Extinta RFFSA em um Trem Regional. O trajeto de 60 km, desde Luziânia, atende aos principais polos habitacionais da parte Sul do DF e Entorno.

Seria beneficiada uma população superior a 500 mil habitantes. A linha, hoje usada só por cargas, já passa pela Cidade Ocidental, Valparaiso, está próxima ao Novo Gama, Gama e Santa Maria, atravessa o Park Way, Núcleo Bandeirante, Guará, SIA, chegando à Rodoferroviária.

Nos cruzamentos com a linhas do BRT-Sul e do Metrô, no Guará; e com a EPTG, tornar-se-ia fácil a integração com ônibus e metrô. O custo de adaptação da linha, apontado à época pela Sudeco, era a metade do BRT-Sul, cerca de R$ 360 milhões. Cada viagem do Trem Regional equivaleria a 15 viagens de ônibus. Centenas de carros particulares deixariam de circular.

Desde o governo Arruda, a cidade desperdiçou oportunidades de custeio para a ampliação da rede de metrô. Ao todo, R$ 1,2 milhão. Passaram-se os governos Arruda, Rosso, Agnelo e Rollemberg e nenhum centímetro de trilho foi colocado. Com a queda de Dilma, Temer acabou com a disponibilidade da verba e ficamos a pé.

Padre Cícero

Forças ocultas, contudo, inviabilizaram o projeto. De pronto surgiram técnicos de plantão para apontar problemas: “o trajeto não é bom, a bitola não é adequada”…, mil argumentos para que não se materializasse. Esqueceram-se, contudo, que nesta mesma linha, até 1996 trafegou o Trem Bandeirante, levando passageiros de Brasília a São Paulo. Por fim, o Ceará calou a boca de todos que só encontram problemas e nunca veem solução. Em pleno sertão, um trecho de igual tamanho, 60 km, foi transformado no VLT do Cariri, que liga o Crato a Juazeiro do Norte e, de quebra, ainda se pede uma benção ao Padre Cícero.

Ônibus não possuem a mesma capacidade de transporte de trens, metrô e VLTs. Foto: Chico Sant’Anna

Passou da hora da linha do Trem Bandeirante virar o Trem Regional do DF. É desumano obrigar as pessoas a perderem cerca de quatro horas de seu dia enlatadas em ônibus superlotados ou presas a engarrafamentos infindáveis. Soluções rodoviaristas além de caras se mostram ineficientes ao longo dos anos. Quatro anos se passaram desde a ampliação da EPIA Sul, para receber o BRT, e ela já apresenta engarrafamentos às quatro da manhã e às quatro da tarde. Um novo governo está por chegar. É importante ter o compromisso das futuras autoridades em soluções mais eficientes, confortáveis, confiáveis e sustentáveis de mobilidade urbana. O rodoviarismo, em todo o mundo, está com seus dias contados. Brasília não pode perder o trem da história.

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