
A Pandemia e as incertezas das eleições municipais desse ano. Até aqui a justiça eleitoral tem conseguido manter o calendário oficial. Em alguns casos, as etapas estão sendo flexibilizadas para que possa ocorrer de forma virtual, na Internet. Mas e na hora de votar?
Por Chico Sant’Anna
Marcada para o dia 4 de outubro, o primeiro turno das eleições municipais deverão levar às urnas cerca de 146 milhões de eleitores, que escolherão 63 mil vereadores, prefeitos e vice-prefeitos dos 5.568 municípios. Trata-se de uma dos maiores escrutínios do mundo ocidental, se não for o maior. A epidemia da Covid-19 trouxe incertezas para esse pleito e há quem defenda o adiamento para 2022, fazendo coincidir com as eleições federais e de governadores. É bom esclarecer, que o Tribunal Superior Eleitoral – TSE já deixou claro que uma mudança de calendário dependerá de lei – e se for mudança de datas de emenda constitucional – aprovada pelo Congresso. A Justiça eleitoral, contudo, está fazendo de tudo para que não haja a necessidade de mudança no calendário municipal e o pleito desse ano aconteça sem transtornos. Até aqui, tem sido possível adaptar as exigências legais por meio das facilidades digitais. Importantes etapas como o prazo de filiação partidária – ou mudança de partido dos candidatos – se deram sem maiores problemas, pois tudo foi feito via internet.
Em 3 de abril venceu a chamada janela eleitoral, período em que políticos podiam mudar de partido para concorrer à eleição e no dia 4 – seis meses antes do pleito – venceu também o prazo para que potenciais candidatos registrassem, se fosse o caso, um novo domicílio eleitoral e aqueles que tinham cargos no poder executivo se desincompatibilizassem. Também os eleitores tiveram até 6 de maio para regularizarem a situação junto à Justiça Eleitoral para poderem votar em outubro. E esse ano, por conta da Covid-19, ficou mais fácil, tudo pode ser feito pela internet: segunda via do título, obtenção do primeiro título, ou mesmo mudança de local de votação. Mais de 1,04 milhão de pessoas solicitaram à Justiça Eleitoral, a regularização de seus títulos.
A partir de 30 de junho, candidatos que apresentem programas de rádio ou televisão terão que se afastar dos microfones. Quem trabalha na imprensa escrita não precisa. Outra etapa que não terá mudanças é o período em que os pré-candidatos aos cargos de prefeito e vereador podem fazer a vaquinha on-line, arrecadando doações dos simpatizantes. Outra vez, tudo será feito de forma virtual, mas um detalhe: só podem doar pessoas físicas e o valor arrecadado só poderá ser usado a partir da campanha efetivamente.

Convenção virtual
Uma etapa que poderia trazer conflitos entre as normas eleitorais e o combate ao coronavírus seria a da realização de convenções, tradicionalmente realizadas de corpo presente. Elas devem ser realizadas entre 20 de julho a 5 de agosto. É nelas que candidatos demonstram seu potencial interno, arregimentando um maior número de apoiadores. Tradicionalmente, as imagens desses eventos já eram usadas no marketing eleitoral. Quem tivesse a festa mais bonita, com mais gente e mais gente importante, em tese, se mostrava uma candidatura mais forte. Mas esse ano, tudo será diferente. Atendendo a pedido do partido Republicanos, o Tribunal Superior Eleitoral – TSE autorizou a realização de convenções pelo sistema de teleconferência. Ou seja, vai ser uma “live” na tela do computador, ou mesmo do celular, com aqueles retratinhos que o brasileiro está se acostumando a lidar.

Duas outras etapas desafiarão a criatividade dos partidos e candidatos. A campanha, propriamente dita e a eleição. Panfletar na rua, bandeiraços, corpo-a-corpo com os eleitores, abraços, tapinhas nas costas, beijos, criancinhas no colo…, nem pensar. Além de poder contribuir para espalhar o vírus, irá demonstrar que o candidato pouco se importa com a saúde de seus eleitores – embora para alguns que já estão no poder, isso não incomode.
Resta saber se o TSE, imbuído dos bons fluídos de combater a pandemia, irá baixar limitações ou alterará regras da propaganda eleitoral. Voltar a permitir cavaletes fixos com publicidade dos candidatos, poderia ser uma saída mais segura. Mas no final das contas, essa deverá ser mesmo uma campanha de redes sociais. Quem tiver os melhores mailinglists, melhores grupos de whatsapp, as páginas mais populares de facebook e, é claro o instagram, deverá levar vantagem. Quem não tem, mas se tiver dinheiro, vai poder comprar esses serviços e ai, outro problema para a Justiça Eleitoral. Os famosos robôs, que por uma boa paga, divulgam a milhões a mensagem desejada, nem sempre verdadeira.

Hora da Urna
Mas e o voto?
Dia 4, como será?
Países como os Estados Unidos aceitam o voto pelo correio, mas lá a cédula é em papel. Na Estônia – nação que fazia parte da União Soviética – desde 2005, o voto pode ser pela internet. Alguns Cantões da Suíça, também já usam o voto pela internet.

O chamado e-voto da Estônia só é possível, graças a existência de uma carteira de identidade inteligente. A cédula permite a autenticação remota segura por meio de assinaturas digitais.
O Brasil já possui sistemas de assinaturas digitais, mas é bastante limitado em especial a processos jurídicos.
Certamente, 2020 não será o ano do e-voto no Brasil, muito ainda temos que caminhar. Não só na adequação da Justiça Eleitoral, mas também na melhoria e universalização das redes de internet, que devem ser mais seguras, e também na educação de nossa população. A Pandemia tem nos mostrado como estamos atrasados nessa área. O cadastramento do auxílio emergencial via Caixa Econômica revela nossa falência estrutural. Se não damos conta de cadastrar 50 milhões de necessitados, como coletar o voto de 150 milhões de eleitores. Certamente, contudo, a covid-19 poderá estimular o avanço na universalização do acesso a internet. E de sua parte, o TSE, a quem já compete a implantação da identidade digital no Brasil, deverá passar a pensar seriamente na hipótese do e-voto. Afinal, o futuro ai está.