Motivos para reduzir o uso de veículos não faltam: redução da poluição, dos acidentes, humanização do trânsito. Como também não faltam opções de coibir o uso dos carros. Uma delas, bem fácil e de imediata aplicação, seria o GDF cumprir o seu papel e determinar que Detran, Polícia Militar e DFLegal multem e até reboquem veículos estacionados irregularmente sobre calçadas, gramados, retornos, filas duplas e triplas. Basta uma voltinha no centro do Plano Piloto pra ver o abuso.
Por Chico Sant’Anna
Em meio à Pandemia e às milhares de mortes já registrada no Distrito Federal, um tema palpita corações e mentes do brasiliense: a cobrança dos estacionamentos em áreas residenciais e comerciais do Plano Piloto. O GDF elaborou o projeto Zona Verde, pelo qual o brasiliense pagará pelo uso de cerca de 115 mil vagas, grande parte em áreas residenciais, onde a rotatividade das vagas deve acontecer a cada duas horas.
Para se ter uma ideia de grandeza dessa proposta, São Paulo, que tem uma população três vezes maior, cobra estacionamento em 44 mil vagas. Ou seja, a terça parte do que deseja a administração Ibaneis Rocha para Brasília. Além de ser apenas a terça parte do que se pretende fazer em Brasília, na maior cidade do país a cobrança se concentra nos centros comerciais da cidade, as áreas estritamente residenciais não são penalizadas.
Sobre a proposta de cobrança de vagas de estacionamento, leia também:
- Mobilidade: Sinal amarelo para a Zona Verde
- Projeto Mobilidade Verde: Brasília à frente do nosso tempo
- Zona Verde: Por um programa de natureza social. Isenções de cobrança a moradores.
Como não poderia deixar de ser, a polêmica se instaurou. Há aqueles que defendem a medida como forma de reduzir a circulação de veículos na Capital. Já são cerca de 1,9 milhão de veículos e Brasília já está entre as dez cidades mais engarrafadas da América Latina. Na cidade, onde dizem que o cidadão é composto de cabeça, tronco e rodas; o motorista já passa a cada ano, quatro dias trancado dentro de seu carro aguardando o trânsito fluir.
Motivos para reduzir o uso de veículos não faltam: redução da poluição, dos acidentes, humanização do trânsito. Como também não faltam opções de coibir o uso dos carros. Uma delas, bem fácil e de imediata aplicação, seria o GDF cumprir o seu papel e determinar que Detran, Polícia Militar e DFLegal multem e até reboquem veículos estacionados irregularmente sobre calçadas, gramados, retornos, filas duplas e triplas. Basta uma voltinha no centro do Plano Piloto pra ver o abuso.
A vias ficariam mais liberadas para quem anda a pé ou de bicicleta. Simultaneamente a essa medida, estacionamentos remotos no Parque da Cidade deveriam ser instalados, dotados de linhas de ônibus (pagas, é claro). Só isso já tornaria a área central mais humanizada. E a TCB ganharia um troco. Também tem que repensar projetos que incentivam o uso de carros, como a via Interbairros.
Impactos externos
Coibir o uso de veículos e, a médio prazo, a posse deles, traz desarranjos em diversas áreas. Uma delas é no próprio transporte público. O metrô e os ônibus já andam abarrotados. Na Zona Verde não há oferta de mais transporte coletivo. Não haverá mais ônibus ou mais metrô. A ideia é de que a atual estrutura carregue mais gente. Chamam isso de otimização. Novos serviços só e quando for implantado o VLT e expandido o metrô. Coisa que o brasiliense já reputa como conto da carochinha. Bicicletários, melhorias nas calçadas e passagens de pedestres também não estão nos planos de curto prazo.
Caixa do GDF
Outro perigo é o reflexo da Zona Verde sobre as finanças do DF. Mal ou bem, as receitas do governo estão baseadas na propriedade e no uso do carro e seus acessórios. Só de IPVA. são cerca de R$ 1 bilhão por ano. Praticamente, a mesma quantia que o governo paga de subsídios às empresas de ônibus com a tarifa técnica. Ela é calculada sobre cada passageiro transportado. Mais passageiros, mais subsidio. Se tirar dos carros e botar nos ônibus, a receita de IPVA cai e a Tarifa Técnica aumenta. E ai? De onde virá o dinheiro?
Do ICMS dos combustíveis são arrecadados cerca de 26% da receita do GDF, descontados os repasses da União. Menos carro circulando, menos gasolina adquirida, caixa menor no GDF. Esses recursos pagam despesas de Saúde, Educação, Segurança, Urbanismo, gastos do metrô, obras, salários de servidores e tudo mais. Inclusive os subsídios do transporte público.
Não há dados específicos sobre a receita fiscal obtida com outros gastos dos carros, tipo pneu, oficinas, acessórios, som, coisas que geram mais impostos. Não defendo a ideia de que os carros são o mal necessário para que a máquina gire em Brasília. Prego que o Zona Verde deve ser melhor pensado, pois poderá ser o caos para a cidade que já vive com o bolso curto.
Indagada, a secretaria de Mobilidade disse não ter analisado o impacto na renda do GDF, nem quantificou quantos novos passageiros irão se avolumar em ônibus e vagões. Uma proposta dessa magnitude deve ser adequadamente pensada, em especial sobre suas externalidades. E, se for o caso, deve estar casada com uma nova estrutura de impostos. Afinal, o contrato é para 15 anos, e sem volta nesse período.
Bitributação
Da forma como foi concebida, a Zona Verde vai ser para os proprietários de veículos – carros e motos – uma espécie de bitributação. Um novo IPVA para os motoristas pagarem, só que um IPVA privatizado. A fatia do leão vai para a empresa concessionária. O GDF ficará com 10%, cerca de 25 milhões ao ano. Bem menos do que as receitas tributárias e mesmo assim, essa verba vem carimbada para a Previdência dos servidores do GDF, que curiosamente acabam de ser penalizados com um aumento da alíquota previdenciária. Ou seja, a verba obtida com os estacionamentos não será investida na mobilidade urbana.
No fundo, parece que o Buriti está de olho mesmo é nos R$ 750 milhões que a empresa vencedora terá que pagar, à vista. Um folego para que o atual inquilino do GDF vitalize sua recandidatura a governador.
Mas e depois?
Os anos que virão: caixa magro no GDF, ônibus cheios e estacionamentos pagos por onde quer que você ande no Plano Piloto.
Essa “proposta” é inacreditavelmente despropositada, e não serve em nada ao trânsito, à mobilidade pública, à cidadania. É forma extorsiva de criar MAIS UM IMPOSTO para o enriquecimento dos que podem – ou acham que podem – tiranizar os brasilienses. Proposta de um governador incompetente, que não tem a menor ideia de como governar com equilíbrio e racionalidade. No caso, acrescente-se a honestidade e a capacidade de gestão que gere melhorias para a qualidade de vida da população. Ibaneis NUNCA MAIS.
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Não me importo com a cobrança, desde que, seja apenas nas áreas comerciais. Jamais nas quadras residenciais.
Por outro lado, essa proposta não teria que ser aprovada pela inútil CLDF?
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