Além da Água Mineral, o governo vai passar pra iniciativa privada as seguintes unidades de conservação: Parque Nacional de Lençóis Maranhenses (MA), Parque Nacional de Jericoacoara (CE), Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (MT), Parque Nacional da Serra dos Órgãos (RJ), Parque Nacional da Serra da Bodoquena (MS), Parque Nacional de Ubajara (CE), e a Floresta Nacional de Brasília (DF).
Por Chico Sant’Anna
Parece que sobrou para a Água Mineral. Após a interferência do presidente Jair Bolsonaro na Petrobrás, com a necessidade de acenar para o mercado, de que não abandonou a linha econômica neoliberal, o ministro do Meio-Ambiente lançou os editais que convocam empresas interessadas em elaborar os estudos da privatização do Parque Nacional de Brasília (PNB) e mais sete parques nacionais. Esses são os parques nacionais mais rentáveis e que mais geram atração de turistas ainda não mão do Estado. A privatização do PNB dar-se-á conjuntamente a Floresta Nacional de Brasília (Flona).
Os chamados modelos de negócios deverão propor “modelos viáveis de uso econômico-financeiro, além de projetos de engenharia, arquitetura e planejamento operacional para os parques”. Após a escolha das propostas vencedoras, as instituições responsáveis terão 120 dias para apresentar os resultados.
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Além da Água Mineral, o governo vai passar pra iniciativa privada as seguintes unidades de conservação: Parque Nacional de Lençóis Maranhenses (MA), Parque Nacional de Jericoacoara (CE), Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (MT), Parque Nacional da Serra dos Órgãos (RJ), Parque Nacional da Serra da Bodoquena (MS), Parque Nacional de Ubajara (CE), e a Floresta Nacional de Brasília (DF).
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O governo de Michel Temer já havia privatizado o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, próximo a Brasília, entregue a um consórcio formado por uma empresa de gestão de terminais rodoviários, a Socicam Terminais Rodoviários e Representações, e empresas Parquetur Participações. Também foi pra iniciativa privada o Parque Nacional do Pau-Brasil, em Porto Seguro/BA. Segundo informou, à época, o portal do Diário da Causa Operária, a empresa que ganhou o processo de privatização daquele parque, a Hope Recursos Humanos, estava sob investigação em processo de fraude em contratos da Petrobrás. A investigação foi sobre irregularidades nos contratos de fornecimento de mão-de-obra terceirizada para a empresa estatal.
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O Parque Nacional de Brasília só não foi privatizado juntamente com essas duas unidades de conservação em função de uma decisão do Tribunal de Constas da União, que à época suspendeu o edital. A privatização dos outros dois parques foi por vinte anos. Agora, o ministro Ricardo Salles, cogita em privatizar por 30 anos.
Estranhamente, o novo edital não foi lançado pelo ministério do Meio-Ambiente ou pelo Instituto Chico Mendes (ICMbio), criado para fazer a gestão de Unidades Ambientais. O edital está na página da Unesco, porém – ao contrário do que informa o governo: “Os editais podem ser consultados na íntegra no site da Unesco” -. ele só é visível para empresas previamente cadastradas e que efetivamente vão participar do processo. O cidadão comum não consegue acessá-lo. Segundo alguns analistas ouvidos, a Unesco possui status diplomático e sua imunidade como organização internacional colocaria o processo longe das investigações do Tribunal de Contas da União.
Na parte visível do portal da Unesco. é dito apenas que o processo leva o nº: 1681/2021 e que se trata de instrumento que tem por objeto “a contratação de pessoa jurídica para realização de estudos técnicos a fim de subsidiar potenciais parcerias com a iniciativa privada para a exploração de atividades de visitação voltadas à educação ambiental, à preservação e conservação do meio ambiente, ao turismo ecológico, à interpretação ambiental e à recreação em contato com a natureza no Parque Nacional de Brasília e na Floresta Nacional de Brasília”. A data limite para recebimento de proposta é 24 de março, próximo.
Como se depreende da ementa do edital, a proposta do governo vai além da privatização (ou concessão à iniciativa privada, como preferem as autoridades governamentais) da gestão turística do Parque. Ela envolve também as ações de preservação e conservação do meio-ambiente, que são atividades privativas do ICMBio. A transferência dessa incumbência para empresas e organizações privadas pode estar dentro do objetivo de extinção do Instituto Chico Mendes ou mesmo sua fusão com o Ibama.
Manejo ambiental é o conjunto de atividades que asseguram a conservação ambiental de uma determinada área. Pela Lei nº 11.516/2007, que ciou o ICMBio, são competências do Instituto as funções de gestão, preservação e conservação (entenda-se manejo ambiental) e não prevê a delegação a terceiros, muito menos à iniciativa privada. Entretanto, ao contrário de privatizações passadas, dessa vez a iniciativa do governo Bolsonaro inclui nas tarefas a serem concedidas à iniciativa privada as ações de conservação, proteção e gestão das unidades.
Segundo informa a Agência Brasil – porta voz oficial do governo federal – o ministério do Meio-Ambiente prevê novas parcerias com a Unesco, notadamente, outros editais para novos estudos, que deverão ser lançados nas próximas semanas.
Unidades de conservação no DF
São duas as unidades de Conservação localizadas no Distrito Federal a serem afetadas com o processo de privatização. O Parque Nacional de Brasília e a Floresta Nacional, que em determinados trechos está em áreas contiguas à poligonal do Parque.
Criado em 1961, na gestão do presidente João Goulart, o Parque Nacional de Brasília, mais conhecido como Água Mineral, tem cerca de 42,3 mil hectares e tem como principais atrações as piscinas abastecidas por águas de nascentes próximas. O parque dispõe de duas trilhas, nas quais os visitantes podem observar a fauna e a flora do cerrado, além de um espaço chamado de Ilha da Meditação, onde é possível fazer observação de aves.
A Floresta Nacional (Flona) de Brasília, foi criada em 1999 com o objetivo de proteger uma área de cerrado de 9 mil hectares. Segundo o portal do ICMBio, ela é uma das unidades de conservação responsáveis pela sobrevivência das nascentes que irrigam a maior represa da região, a do Descoberto, responsável por aproximadamente 70% do abastecimento de água do Distrito Federal.
Representação
Em outubro de 2020, os dois candidatos ao Senado pelo Psol-DF nas eleições de 2018, o advogado Marivaldo Pereira e o jornalista Chico Sant’Anna – editor desse blog – deram entrada no Ministério Público Federal requerendo a anulação do Decreto nº 10.447, de 07 de agosto de 2020, baixado por Jair Bolsonaro, que incluiu o PNB nos bens do Estado a serem privatizados.
“O patrimônio do Distrito Federal e de sua população são duplamente afetados pelo processo de privatização do Parque Nacional de Brasília. Tanto pelos riscos que o projeto representa para a preservação ambiental, como pelo seu impacto nas fontes de abastecimento de água potável, situação que torna-se ainda mais grave quando consideramos o histórico das crises hídricas enfrentadas pela população local” – sustentaram os dois na representação, que ainda não teve desdobramentos pelo Ministério Público.
Também foram signatários da representação os jornalistas José Carlos Sigmaringa Seixas, Antônio Burity, o comunicólogo, Thiago Ferreira, e o estudante de direito e integrante da direção nacional do Psol, Nilton Nalin. Todos filiados ao Psol e vinculados à questão ambiental.
Na representação é argumentado que o decreto de Bolsonaro está “repleto de ilegalidades e sua anulação deve ser pleiteada em juízo” pelo Ministério Público Federal. Duas são as principais razões: o abastecimento hídrico e a preservação da área da Biosfera do Cerrado – área que o Brasil e o Distrito Federal assumiram a responsabilidade de preservá-la, perante à Organização das Nações Unidas.
Água
É importante lembrar ainda que de cada dez litros de água consumidos em Brasília, três litros vem da represa de Santa Maria, que fica no interior do Parque. Nem a Adasa, nem a Caesb, nem o GDF foram consultados pelo governo federal sobre eventuais impactos da privatização do Parque sobre o abastecimento d’água na Capital Federal. Essa seria mais uma das irregularidades dessa iniciativa de privatização.
As duas unidades de conservação se mal conservadas podem trazer impactos importantes sobre a represa do Descoberto, que recebe água de nascentes da Flona, e da de Santa Maria, localizada dentro do PNB. Nenhum estudo de impacto ambiental ou de externalidades sobre a garantia dos recursos hídricos foi previamente elaborado pelo governo.
Nova representação
Marivaldo Pereira e Chico Sant’Anna preparam novas representações, dessa vez voltadas ao Tribunal de Contas da União. Causou estranheza o lançamento desses editais via uma organização internacional, no caso a Unesco. A avaliação feita é que isso fere a capacidade de controle do Tribunal de Contas, elimina a transparência pública no processo e, ainda por cima, reduz a livre concorrência.
Seu blog está cada vez melhor. Parabéns!
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