Poema de Paulo José Cunha. Foto de Tânia Rego/ABr

As mãos vazias do rico
exibem a prova do alcançado.
Não mais mãos do a fazer, mas do já feito;
bem tratadas, finas, alisadas,
mãos que não carregam nada,
pois carregar já não lhes diz respeito. 

 

Mas as mãos do pobre
sim, carregam um saco 
onde transportam o apurado: 

 

garrafa azul vazia (linda pra botar
rosa de plástico!); sobra de almoço; 
produto de furto miúdo,


que ajuda a garantir o passadio;
miudeza de camelô, pano de prato, muda de planta;
revista com retrato de artista;
essas coisas. 


Pelas paradas de ônibus, 
filas da beneficência e ruas de comércio,
observe:  
todo pobre arrasta um fardo,  
uma tarefa, uma sina,  
um que-fazer 


guardado num saco branco,  
desses de supermercado,  
de plástico leitoso, com alcinhas. 
Saco nem leve nem pesado,  
mas incômodo feito pobreza incompleta  
(pobreza dessas  
que a morte  
nem se preocupa em cumprir 
na inteireza).