
Iniciada em 2015, a cidade é bastante futurística, embora com traços que lembrem raízes históricas do país. Não pode se afirmar que a cidade tenha sido inspirada em Brasília, mas é perceptível a semelhança. Ao contrário do que propõe o GDF na nova Lei de Uso e Ocupação do Solo do DF, o projeto egipcio prevê a cidade dividida em setores, como o fez Lucio Costa há mais de 60 anos. Ela se divide em 21 distritos residenciais e 25 distritos dedicados. Esses últimos equivalem aos setores que organizam o espaço urbano de Brasília.
Por Chico Sant’Anna
No universo das análises esotéricas sobre as origens de Brasília, uma delas relaciona a capital federal à cidade de Aquetáton – hoje sítio arqueológico denominado Amarna, – construída pelo faraó Aquenatom, que há mais de cinco mil anos foi capital do Egito. Estudiosos apontam, inclusive, a semelhança do formato do Plano Piloto com uma expressão da deusa Iris com suas asas abertas. Essas hipóteses foram desenvolvidas, em especial, pela professora de Egiptologia da Universidade de Brasília, Iara Kern, e pelo professor de Língua Portuguesa e Latim, Ernani Pimentel, que lançaram no passado obras sobre o tema. A proliferação pela cidade de edificações no formato piramidal, como a Ermida de Dom Bosco, o Templo da Boa Vontade e a antiga sede da Ceb – já demolida – seriam outros indícios dessas ligações. Passados cinco mil anos, as influências parecem ter se invertido e hoje é Brasília que demonstra inspirar o formato da nova capital do Egito, que está sendo erguida no meio do deserto, entre Cairo e o Canal do Suez.
Com uma área de 25 mil Km² – cinco vezes maior do que o Distrito Federal – a cidade que se ergue nas areias do Saara ainda não tem um nome oficial. No Cairo, chamam-na de Nova Capital, Nova Cairo ou apenas capital administrativa. O certo é que parte da máquina burocrática do governo egípcio deve começar a ser transferida já no fim desse ano. A meta é que até o final do ano que vem, 52 mil funcionários do governo serão transferidos para as novas estruturas. Até 2050, a nova cidade deverá abrigar uma população de sete milhões de habitantes.

O projeto urbanístico da empresa norte-americana, sediada em Chicago, Skidmore, Owings & Merrill prevê a execução da cidade em três etapas. A primeira envolve o Executivo e o Legislativo, tem um custo de US$ 58 bilhões – financiados pela China e Emirados Árabes – e deverá estar pronta até 2030.
A segunda envolve a fixação de cidadãos não funcionários públicos que desejarem lá habitar. O governo está vendendo imóveis para ajudar a cobrir as despesas. E, por fim, o Judiciário, cujo início das obras de suas instalações foi anunciada agora em outubro. Não está claro, se a exemplo de Brasília, as representações diplomáticas deverão também se mudar.

O projeto foi abraçado pelos militares que estão no poder desde o golpe de estado de 2013, quando o então presidente eleito, Mohamed Morsi, foi destituído pelo seu ministro da Defesa, Abdul Fatah Khalil Al-Sisi. Morsi, que morreu na prisão em 2019, pertencia ao partido Irmandade Muçulmana, visto pelos Estados Unidos como mais uma perigosa força islâmica no mundo árabe. Coincidência, ou não, as instalações da sede do futuro ministério da Defesa lembram o Pentágono norte-americano. Só, que nesse caso, será um octógono, o Octagon que abrigará o Centro de Liderança Estratégica do Estado, complexo estratégico militar que os egípicos prometem ser o maior do gênero no Oriente Médio.

Semelhanças urbanísticas

Iniciada em 2015, a cidade é bastante futurística, embora com traços que lembrem raízes históricas do país. Não pode se afirmar que a cidade tenha sido inspirada em Brasília, mas é perceptível a semelhança.
Ao contrário do que propõe o GDF na nova Lei de Uso e Ocupação do Solo do DF, o projeto egipcio prevê a cidade dividida em setores, como o fez Lucio Costa há mais de 60 anos.
Ela se divide em 21 distritos residenciais e 25 distritos dedicados. Esses últimos equivalem aos setores que organizam o espaço urbano de Brasília. Lá haverá o governamental, o comercial e o denominado downtown (centro) district. Nessa última área, grandes espigões com mais de 80 andares – um prédio de 385 metros de altura promete ser o mais alto de toda a África – formarão um núcleo para receber bancos, financeiras, será a city egípcia.

Haverá ainda os distritos de hotéis e shoppings, o dedicado às artes e às ciências e o setores residenciais. Por sinal, alguns desses setores se assemelham às superquadras de Brasília, porém em formato circular. Os prédios em seu interior terão dez andares, sem piloti. Os bairros serão interconectados por um lago artificial, denominado Rio Verde. Quando completo, terá a extensão de 35 km. Um grande parque e estádio de futebol tornarão a vida menos árida na nova capital.


Esplanada dos Ministérios
Outra semelhança grande é com a Esplanada dos Ministérios da nossa capital federal. Na Nova Cairo, o prédio do parlamento, cuja construção está envolvendo 6.400 operários, se impõe sobre uma grande esplanada no distrito governamental. Ao contrário dos ministérios brasileiros, que possuem forma de lâminas, os do Egito serão no formato de cubos.
À frente do parlamento egípcio a grande Praça do Povo faz lembrar a simbologia do espaço projetado para a Praça dos Três Poderes. Na praça, está prevista instalação do “maior mastro de bandeira do mundo” que reverenciará com a bandeira nacional os mártires do país.
Outra similitude que aguça os sentidos é com o chamado National Mall, da também projetada cidade de Washington. Trata-se de um grande eixo proveniente do Capitolio até o Washington Memorial, em forma de obelisco. Na nova capital o “mall” iria da grande mesquita até o grande mastro.
Algumas edificações são assinadas por renomados arquitetos estrangeiros, como a Grande Ópera, de autoria do arquiteto e urbanista italiano Stefano Boeri, que previu para a fachada nos imóveis jardins verticais.

Uma colossal mesquita já está pronta: A Al Fatah intenciona rivalizar-se com a Mesquita Azul, de Istambul. Contará com o centro de cultura islâmico e um minarete de 140 metros de altura. Tentando preservar uma identidade ecumênica, o Egito também prevê a construção da Catedral da Natividade de Cristo, que promete ser o maior templo católico do Oriente Médio.

E como se trata de um espaço egípcio, a exemplo dos antigos faraós, o governo fará erguer um imenso obelisco, o Oblisco Capitale, com altura de 1.000 metros, tornando-se o mais alto do mundo. Entretanto não será uma edificação monolítica, ela deverá abrigar escritórios em seu interior.
Motivações
O que leva um país que está quebrado e se valendo de ajuda do Fundo Monetário Internacional a construir uma nova capital? Ao contrário de Brasília, o objetivo não é o de interiorizar o desenvolvimento ou de fomentar a integração nacional.
Na prática, o Egito se rende a triste constatação que o Cairo não tem mais jeito. A conurbação Cairo, Gizé – separadas apenas pelo Nilo – e Shubra El-Kheima se transformou numa mega cidade, com mais de 25 milhões de habitantes e que, até 2050, deve passar dos 40 milhões.
Embora ainda invista em melhorias urbanas, como a ampliação de uma das três linhas do metrô, Cairo, segundo alguns especialistas, não tem mais conserto e uma nova cidade se faz necessária para aliviar a superlotação da capital atual.
Mas esse é o tema da coluna da próxima semana.
Até lá.
Bela e interessantíssima matéria, Chico! Parabéns!
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Excelente texto. Bem instrutivo. Parabéns.
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Bela matéria, informação interessantíssima. A conurbação e os mais de 25 milhões de habitantes, que caminham para os 40 milhões, até 2050, e a insegurança tornam vida cotidiana no Cairo impossível. Desmotiva qualquer um a visitar os belos sítios arqueológicos. Parabéns Chico!
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Brasília tem uma importância histórica e es´piritual não só para nós, mas para todo o mundo. Alguns países estão seguindo nosso modelo: Paquistão, Nigéria, Egito, até a Indonésia.
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Grande, Chico! Mais uma vez passando informação com uma linguagem tranquila. Li o texto viajando pela nova capital do Egito. Parabéns!
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