Na quinta-feira, 2/12, o governador Ibaneis Rocha decidiu devolver aos carros a pista que, entre as quadras 503/703 e 512/712 Sul, estava dedicada há quase um ano e meio às pessoas, em especial às crianças. À imprensa, o secretário de Governo, José Humberto Pires, explicou que O Viva W.3 foi uma forma de se criar uma nova opção para as pessoas saírem de casa, em meio a pandemia, e que não há mais necessidade disso diante da reabertura dos espaços públicos. Foto de Uirá Lourenço.

Por Chico Sant’Anna:

O Governo do Distrito Federal parece gostar de comprar briga com os moradores de Brasília. É só uma iniciativa estar dando certo, ganhar a simpatia da comunidade e la vai GDF mudar tudo. Essa sina parece estar acontecendo novamente, desta vez com os moradores linderios da Avenida W.3 Sul. Há um ano, foi lançado o programa Viva W.3, como parte do processo de revitalização da avenida que já foi a principal artéria da Capital Federal. W3 Sul. Com o Viva W.3, a exemplo do que ocorre aos domingos no Eixão do Lazer, a avenida também seria reservada a pedestres, praticantes de esportes, gente que buscava um espaço para o ócio. A população aprovou e aproveitou a abertura da avenida para pedestres aos domingos: pode curtir mais, mais lazer ao ar livre, mobilidade e qualidade de vida, menos poluição química e sonora” ressalta Carlos César Batista, presidente da Associação dos Moradores das Quadras 700 Sul– Amo700.

O que era alegria, contudo, virou revolta. Na quinta-feira, 2/12, o governador Ibaneis Rocha decidiu devolver aos carros a pista que, entre as quadras 503/703 e 512/712 Sul, estava dedicada há quase um ano e meio às pessoas, em especial às crianças. À imprensa, o secretário de Governo explicou que O Viva W.3 foi uma forma de se criar uma nova opção para as pessoas saírem de casa, em meio a pandemia. “Agora arrefeceu a pandemia, os parques abriram, os espaços públicos podem ser usados e nós temos oportunidade de dar continuidade a reforma” – afirma José Humberto Pires, complementando que o GDF está reformando três praças existentes ao longo das quadras 700, como a Praça 21 de Abril. Entretanto, só existem praças entre a 708 e a 704. No restante da avenida, não existe espaço similar.

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Para os moradores, a decisão do GDF foi um presente de Natal às avessas e, na verdade, buscou apenas atender a um grupo de comerciantes, notadamente supermercados – já que as demais atividades comerciais quase não abriam aos domingos – desprezando a opinião dos moradores. Mesmo assim, os supermercados tem acesso de clientes motorizados via a W.2, onde muitos já a utilizam devido a maior facilidade de estacionamento.

Bicicleata

“Não podemos deixar essa iniciativa acabar. A W.3 Sul está próxima de se transformar em um importante corredor cultural do DF” – exalta mensagem veiculada pelas redes sociais, ao convocar todos, vizinhos da W.3, ou não, para uma manifestação no domingo, 5/12, às 10h, na 506 Sul, em frente ao bloco A.

Também está sendo convocada uma bicicleata. Na verdade serão vários passeios de bikepela avenida. Uma demonstração de que a luta pela qualidade de vida e mobilidade em Brasília não vai morrer. A saída será às 9h30 do edificio Brasil 21, passando pela Igreja de Dom Bosco e terminando no Mercado do Café, na 509 Sul.

Defensores de que a W.3 seja uma via peatonal aos domingos e feriados alegam que falta criatividade aos comerciantes em não gerar atrativo para que esse contingente populacional consuma em seus estabelecimentos.Foto de Milvo/União Ciclistas do Brasil.

Comércio

O Sindvarejista admite que pediu ao GDF para revogar a destinação da W.3 só para pedestres numa forma de potencializar o comércio nesse período de vendas de Natal. Defensores de que a W.3 seja uma via peatonal aos domingos e feriados alegam que falta criatividade aos comerciantes. “Fico surpreso ao caminhar pela W3 fechada e perceber dezenas de comércios que poderiam estar aproveitando o movimento para lucrar. Restaurantes, lanchonetes… tudo fechado! Depois reclamam do universo” comentou o designer Caio Porto, numa plataforma social, onde está pegando fogo o debate.

No contraponto, a jornalista Renata afirma não fazer sentido (o fechamento da via para pedestres), com o eixão e o parque tão pertos. “A revitalização tem que passar por outros pilares, com a abertura de mais comércio”.

Outros lembram que o Eixão do Lazer é hoje uma alternativa para as atividades comerciais, tais como locação de biciletas, equipamentos de entretenimento de crianças e, até mesmo, feiras ou eventos de culinária. Movimentando a economia de Brasília.

Para o blogueiro, Anderson Magalhães, a lógica dos automóveis manda na cidade, causa danos ao meio ambiente, acidentes e cria espaços urbanos hostis a vidas não motorizadas.Foto de Milvo/União Ciclistas do Brasil.

Cidade para motorizados

Esse debate oculta uma polêmica ainda maior em Brasília, cidade projetada, como diz a lenda, para um ser dotado de cabeça, tronco e rodas. Para o blogueiro, Anderson Magalhães, a lógica dos automóveis manda na cidade, causa danos ao meio ambiente, acidentes e cria espaços urbanos hostis a vidas não motorizadas. “Os carros ocupam a maioria das vias urbanas, 24h, todos os dias! É importante que para democratizar os espaços urbanos existam mais vias para pedestres e ciclistas mesmo que só em um dia da semana por algumas horas. Na verdade o GDF tá fazendo bem pouco” – comenta ele.

O blog tentou ouvir a administradora de Brasília, Ilka Teodoro, mas não teve retorno. O espaço aqui continua aberto à ela.