Originalmente, o Canta Nordeste foi criado para mostrar a cena musical da região, revelando os clássicos e os modernos. Com o tempo, além da arte e cultura, passou a revelar também a realidade sócio-econômica, aspectos históricos, política, belezas e horrores do Nordeste. O programa denunciou a violência, o machismo, o racismo; tratou do cangaço, da seca e da fome; contou das belezas do sertão e das riquezas do litoral.

Por Romário Schetino, publicado originalmente no portal Brasiliarios

Neste domingo, dia 23/1, às 16h, o programa Canta Nordeste vai ao ar pela última vez na Rádio Cultura FM 100,9. O jornalista Dioclécio Luz e Cíntia Magalhães, apresentadores do programa, encerram uma história que tem 33 anos na emissora estatal de Brasília. Era o mais antigo da Cultura FM.

Ao longo desse tempo o Canta Nordeste foi uma atividade voluntária, sem custos para a rádio ou para o estado. Nesses 33 anos só ocorreu uma exceção – durou dois semestres.

Foi quando o programa se candidatou e foi selecionado para receber recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). O Tribunal de Contas do Distrito Federal, porém, entendeu que colaboradores ou voluntários da rádio não podiam captar recursos do FAC, exigindo da secretaria de Cultura que nos próximos editais do Fundo figurasse esse veto. O veto foi firmado e atinge a toda categoria da radiodifusão.

A decisão do TCDF inviabiliza todos os outros projetos que Dioclécio e Cíntia planejaram para 2022 contando com recursos do FAC, incluindo um podcast sobre literatura e programas sobre diversidade em outras emissoras. A única possibilidade desse fim de mundo não acontecer, era deixar a Rádio Cultura, deixar de ser colaborador ou voluntário. E é o que está sendo feito agora.

Originalmente, o Canta Nordeste foi criado para mostrar a cena musical da região, revelando os clássicos e os modernos. Com o tempo, além da arte e cultura, passou a revelar também a realidade sócio-econômica, aspectos históricos, política, belezas e horrores do Nordeste. O programa denunciou a violência, o machismo, o racismo; tratou do cangaço, da seca e da fome; contou das belezas do sertão e das riquezas do litoral. Foram diversos programas sobre meio ambiente, muitos sobre o feminismo, dezenas da sua luta antirracista, vários contra esse governo que festeja a morte dos brasileiros.

Da música, trouxe nomes consagrados, como Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa. Fez entrevistas com Baby Consuelo, Tomzé, Quinteto Violado, Geraldo Azevedo, Fagner, Zé Ramalho, Hermeto Paschoal, Marinês, Elomar, Elba Ramalho. Foi um dos primeiros em Brasília a entrevistar e tocar Chico César, Lenine, Chico Science. Abriu as portas para as meninas que hoje fazem a diferença na música brasileira, caso de Flaira Ferro, Juliana Linhares, Luedji Luna, Socorro Lira, Lorena Nunes.

Brasília é Canta Nordeste. O programa mostrou a arte de Beirão, Rênio Quintas, Paraibola, Chinelo de Couro, Célia Porto, Alberto Salgado, Afonso Gadelha, Roberto Correa, Orquestra Marafreboi, Marcelo Café, Clôdo, Climério e Clésio Ferreira, Haono Beko, Criolina, Gog, Túlio Borges, Zelito Passos, Carlinhos Piauí, entre muitos outros. Não é exagero dizer que o Canta Nordeste se tornou parte da história da cena cultural de Brasília.

Ele agora encerra sua história na Rádio Cultura FM, mas não morre. O programa já é veiculado na Rádio Eixo (via internet) e em três rádio comunitárias: Utopia (Planaltina, DF), Valente (Valente, Bahia) e Noroeste (Campinas, São Paulo). Se anime, cabra! “Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”, como disse Belchior.