
A Capital Federal está longe de ser um exemplo de sustentabilidade a ser seguido. O Instituto Cidades Sustentáveis desenvolveu o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – Brasil (IDSC-BR). Por ele, o Distrito Federal apresenta uma modesta pontuação, 57,52, numa escala onde 100 é a excelência. Está na 311ª posição, dentre os 5.570 municípios do Brasil, perdendo para cidades com bem menos recursos como São Caetano do Sul, Jundiaí e Valinhos, que lideram o ranking.
Por Chico Sant’Anna
Brasília foi concebida sob a filosofia de cidade-parque, um modelo urbanístico derivado do conceito de cidade jardim, garden city, desenvolvido pelo britânico Ebenezer Howard, ainda no final do século XIX, para assegurar a permanência da natureza nas cidades que já demonstravam vocação para crescer. Não precisa ser um conaissaire de urbanismo para entender que a proposta era de uma cidade ambientalmente correta. Nos dias de hoje, uma cidade tida como sustentável vai além dos parques e jardins. A ONU relacionou 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). É a chamada Agenda 2030, um pacto supranacional para o enfrentamento dos principais desafios globais e que foi assinado por 193 nações dentre eles o Brasil.
Tomando como padrão esses 17 objetivos, a Capital Federal está longe de ser um exemplo a ser seguido. O Instituto Cidades Sustentáveis desenvolveu o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – Brasil (IDSC-BR). Por ele, o Distrito Federal como um todo, apresenta uma modesta pontuação, 57,52, numa escala onde 100 é a excelência. Está na 311ª posição, dentre os 5.570 municípios do Brasil, perdendo para cidades com bem menos recursos como São Caetano do Sul, Jundiaí e Valinhos, que lideram o ranking.
O relatório do IDSC-BR é um ótimo guia para os políticos que se posicionam para comandar o DF nos próximos quatro anos. Fazer Brasília subir nesse ranking já seria um excelente governo. A tarefa, contudo, não é fácil, pois os erros e omissões passadas se avolumaram. Para a professora de Saúde Pública da Universidade de Brasília, Fátima Sousa, Brasília está longe de ser uma cidade saudável. “A pandemia expôs as feridas abertas dos descasos, despreparos e descompromisso em pensar um outro modelo econômico, social, ecológico e cultural para que o povo do DF possa viver com dignidade, e desfrutar das riquezas e potencialidades dessa cidade” – diz ela.

Desigualdade social
A cidade que prometia ser a capital da esperança, a terra prometida, de onde jorraria leite e mel, segundo a profecia de Dom Bosco, peca exatamente nas desigualdades sociais, como o combate à fome e a promoção da igualdade entre gêneros.
Isso sem falar que aqui os habitantes convivem com a dicotomia de possuir um dos maiores PIB per capita, e ser a campeã de desigualdade. No Lago Sul, o rendimento médio mensal é de R$ 8,3 mil, já em Samambaia, Varjão, Paranoá, Riacho Fundo II e Estrutural, a renda média é menor do que um salário mínimo. Pelo índice de Gini, medidor da desigualdade na distribuição de renda, o DF ocupa a segunda posição no ranking de desigualdade econômica em comparação com outros estados. Perde apenas para Sergipe.
Se fosse uma estudante, Brasília passaria de ano raspando, ficando quase que de recuperação. Sua nota é considerada “média”. Esse baixo desempenho é reflexo principalmente das omissões do poder público. Apesar dos quase R$ 50 bilhões em orçamento para 2023, o investimento em infraestrutura sustentável é baixo ou quase nulo. A avaliação foi de apenas 28,7, nota “muito baixa” diante de os “significativos” desafios a serem superados. E o brasiliense sente isso na pele. Não conta, por exemplo, com uma malha ampla e eficiente de metrô. Os ônibus são velhos e ainda movidos a óleo diesel, quando em 2013, segundo relata o ex-deputado Joe Vale (PDT), uma lei de autoria dele foi aprovada determinando que a cada ano, um décimo da frota fosse substituída por ônibus elétricos ou a biodiesel. “Nesses quase dez anos, já era pra toda frota ser sustentável” – comenta ele.
O desempenho de Brasília, nos principais quesitos de natureza social, são reprováveis. Ficaram abaixo do 50. Confira:
Fome zero – 49,43. Nesse quesito, a quantidade de recém nascidos que vem ao mundo com baixo peso; a amplitude da desnutrição infantil, a quantidade de produtores rurais cadastrados pelo Programa de Apoio à Agricultura Familiar, bem como os voltados à produção de alimentos orgânicos, que recebem incentivo.
Redução das desigualdades – 43,16. A nota foi dada com base nos dados existentes até 2020. Foram computados os percentuais de pessoas inscritas no cadastro único, bem como quantas, desse universo, são atendidas pelo Bolsa Família. Certamente, seriam mais negativos se considerassem a realidade social atual, com milhares de famílias dormindo ao relento na expectativa de se cadastrarem nos CRAS para receber o auxílio financeiro.
Cidades e comunidades sustentáveis – 41,62. Nesse quesito, a baixa qualidade do transporte público, 22,45; a quantidade de mortes no trânsito, 8,90; quantidade de moradores residentes em favelas e invasões, 5,20; falta de equipamentos públicos para a prática de esporte e lazer, 0,47, são alguns dos quesitos avaliados.
Igualdade de gênero – 39,61. Brasília apresenta uma forte discriminação de gênero que se traduz em elevada taxa de feminicídio, diferenças salariais entre homens e mulheres beirando os 30%, maior taxa de desemprego feminino
Inovação e Infraestrutura – 28,7. Falta de investimentos em mobilidade urbana e infraestrutura sustentável. O GDF há décadas não investe na ampliação da linha do metrô, deixou de implantar o VLT, aposta excessivamente no rodoviarismo e posterga a renovação da frota de ônibus com a introdução de ônibus elétricos.
O DF apresentou desempenho mediano nos seguintes quesitos:

Proteger a vida terrestre – 64,38. Calculado a partir da taxa de áreas que preservam vegetação natural – que o DF vem perdendo ano a ano – áreas reflorestadas, unidades de conservação (parques ecológicos) e volume de financiamento da proteção ambiental.
Trabalho decente e crescimento econômico – 63,36. Taxa de PIB per capita, que deve ter puxado esse indicador para cima; nível de desemprego geral e especifico de jovens e percentual de Jovens de 15 a 24 anos de idade que não estudam nem trabalham
Paz, justiça e instituições eficazes – 62,12. Medido a partir de uma coletânea de indicadores, tais como taxa de homicídio, em especial o juvenil; mortes por armas de fogo, transparência nas estruturas policiais, combate à corrupção policial, grau de comprometimento policial no fomento aos Direitos Humanos.
Educação de qualidade – 59,17. O estudo considera que o DF tem grandes desafios a vencer, em especial no que diz respeito erradicação do analfabetismo (embora a cidade tenha o maior índice nacional de pessoas com nível superior, em 2020 estimava-se que 66 mil maiores de quinze anos eram analfabetos). Também foi avaliada a qualidade das instalações dos colégios, a existência de conexão das escolas, inclusive fundamentais, à rede de internet, o desempenho no Ideb (em 2020 o DF ficou abaixo da meta em todos os níveis da educação básica), dentre outros indicadores de Educação.
Consumo e produção responsáveis – 53,05. A cidade praticamente foi reprovada nesse item por ter, de um lado, uma alta quantidade de produção de lixo residencial – cada brasiliense produz por dia 1,55 kg de lixo doméstico –, e, de outro lado, um baixo percentual de reciclagem dos resíduos sólidos, de não existir uma coleta seletiva universal e de qualidade
O desempenho de Brasília foi considerado satisfatório ou elevado nos itens referentes a oferta de energia limpa e acessível – 94,22; de água limpa e saneamento – 86,94. Ação contra a mudança global do clima – 75,55, que se refere basicamente à emissão de gases de efeito estufa. Entretanto, segundo relatório do ministério do Meio-ambiente, o DF, em 2016, lançou na atmosfera 7,23 mil toneladas de CO2, 1,5 mil tonelada de metano e 354 toneladas de óxido nitroso. A frota de quase dois milhões de veículos responde por 53,4% da emissão de gases de efeito estufa na Capital Federal.
Saúde e bem-estar – 71,13. O estudo considera que “há grandes desafios a serem superados” nesse quesito, notadamente na cobertura vacinal, na incidência de Dengue (a Covid não foi considerada, pois o estudo é com dados de até 2020), a quantidade de unidades básicas de saúde em funcionamento pleno, o total de equipes em campo do Saúde da Família (antigo Saúde em Casa); taxas de mortalidade materna, infantil, neonatal e de esperança de vida ao nascer, dentre outros indicadores.
No balanço geral, pode se dizer que quem vier a ser eleito para governar a partir de 2023 terá desafios enormes e sérios pela frente, se desejar alterar a posição de Brasília e torná-la uma cidade efetivamente sustentável. Para Fátima Sousa, cabe a sociedade virar essa triste página e escrever uma outra e nova história para Brasília, na qual se faz necessário mudar o modelo de governança política, “deixando para trás o velho “modelito” de fazer política, onde o povo, seus sonhos, suas dores, seus potenciais, seus obstáculos não passam de matéria prima para construção de discursos eleitoreiros demagógicos, com o fim de chegar ao poder, e, estando lá governar para as elites.”
Com a perda de 30% da Flona, dentro de pouco tempo, o Lago Paranoá, diminuirá sensivelmente seu espelho d’água.
Dependendo só das chuvas, porque não há rios caudalosos no DF, temos já uma tragedia anunciada.
Quem viver verá!!!!
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Nossos governantes têm sido homens viajados E ignorantes, seres que parecem ter vindo direto do século XVI ou algo assim. Tão ignorantes que “sustentabilidade” é mesmo MANTER-SE NO PODER, controlando o orçamento bilionário do DF. Incapazes de planejar e de prestar contas às futuras gerações pelas decisões do momento. É impossivel que Brasília tenha sustentabilidade, a meu ver, jornalista,
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Brasília, uma cidade (in)sustentável? Nisso não há qualquer novidade.
Se o que mais tivemos foram governos imprestáveis, Brasília teria que ser, necessariamente, uma cidade (in)sustentável.
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