Por Chico Sant’Anna

Como é difícil driblar o racismo e a descriminação social. A luta de Vini Jr, de banir o racismo dos esportes, parece ser inglória. Não apenas pelo imobilismo das pessoas e instituições que poderiam agir de fato para combater a discriminação, mas, principalmente, pelo fato de que novas gerações, jovens brasileiros, que deveriam representar a mudança, realimentam esse sentimento doentio, demonstrando que o racismo é estrutural e reflexo da divisão de classes sociais. Triste exemplo disso ocorreu em Brasília, cidade que deveria ser o berço de uma nova civilização, durante partida de futebol, pela Liga das Escolas, entre a Escola Franciscana de Fátima e o Colégio Galois.

A Escola de Fátima, localizada na quadra 906 da Asa Sul, é um colégio religioso que investe muito em esportes. Equipes de diferentes modalidades já disputaram torneios no exterior. Por isso, foi convidada a participar de um certame restrito a poucas colégios, que reúne a elite financeira das escolas da Capital Federal: Escola Americana, Escola das Nações, Escola Britânica, Mackenzie, Coq, dentre outros. O que não esperavam os jovens jogadores de futsal da equipe sub 18 convidada é virar alvo de chacotas, xingamentos raciais, agressões verbais aos seus pais, comparação a macacos e gorilas.

Torcida uniformizada

O jogo foi dia 3 de abril, no ginásio da unidade do Galois, quadra 601. O comportamento agressivo partiu, segundo informa nota da Escola de Fátima, da torcida do time oposto, formado por alunos no Colégio Galois, um dos colégios mais caros de Brasília. “Da arquibancada, alunos vestindo o uniforme do Galois gritavam para os jogadores adversários: ‘filhos de empregada’, ‘suas mães lavam o banheiro da minha casa’, ‘seu pai é meu faxineiro”, ‘pobrinho’, e imitavam gorilas batendo ao peito ou pulando como macacos” – relata o professor de educação física e técnico do time, Carlos Maia, que diz ter procurado docentes do Galois e o árbitro da partida, mas que nada de efetivo foi feito. “Se isso não pode acontecer num Fla-Flu, como vamos aceitar numa competição escolar” – indaga o vice-diretor, Jarbas Toledo.

Segundo o técnico, os alunos ficaram abalados e pediram pra abandonar o jogo antes do seu término. “Estavam com os olhos em lágrimas, nervosos, tristes e revoltados, o psicológico desses meninos ficou muito afetado” – relembra ele.

A Escola levou o assunto à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente e ao Conselho de Educação do Distrito Federal, órgão da secretaria de Educação, responsável por estabelecer normas e diretrizes para o Sistema de Ensino do Distrito Federal. Há informações de que pais iriam solicitar o apoio do Ministério Público. Um ofício de protesto também foi enviado ao Galois, a quem a Escola de Fátima rotula como “conivente com a situação humilhante e vexatória vivida pelos alunos. […] A omissão diante de tais comportamentos envia uma mensagem perigosa de conivência e tolerância com atitudes discriminatórias.”

“É inadmissível que em pleno século XXI, ainda tenhamos que presenciar atos tão repugnantes como os que foram direcionados aos nossos atletas. A escola, como instituição responsável pela formação e educação de crianças e jovens, tem o dever moral e ético de repudiar veementemente quaisquer manifestações de preconceito e discriminação” – registra o ofício.

Pilares do Galois

Procurado, o Galois se limitou a enviar cópia de uma circular redigida em resposta à denúncia, na qual afirma que os “pilares” do colégio “se baseiam no respeito à diversidade e na promoção da inclusão” e que não ficarão inertes ao ocorrido.

“Entendemos que o ocorrido não só afetou esses alunos, mas também manchou o espírito de amizade e respeito que deve prevalecer em eventos educacionais e esportivos. Por isso, não somos, de forma alguma ser coniventes a qualquer tipo de ato discriminatório. […] Já iniciamos uma investigação rigorosa interna e estamos comprometidos em não apenas identificar os envolvidos, mas também a aplicar medidas disciplinares e ampliar, ainda mais, ações educativas necessárias pertinentes” – registra, sem especificar quais medidas disciplinares.