As características urbanísticas do Park Way têm como propósito proteger a fauna e a flora do Cerrado e, principalmente, assegurar a potencialidade hídrica do bairro, responsável por 30% da água que chega ao Lago Paranoá. Vista aérea da quadra 26 do Park Way. Foto de Chico Sant'Anna.

Os reais efeitos das novas regras da Luos ainda serão sentidos mais na frente, mas o tema que palpitou as manchetes dos jornais foi a possível autorização de atividades econômicas nas residências do Park Way, Lago Sul e Norte. A pressão dos moradores dos três bairros foi grande, a CLDF teve que recuar. Um recuou não integral. Pelo caminho ficaram portas entreabertas. Escolas pré-existentes à Luos poderão continuar a funcionar e até terem o ponto passado à frente. O mesmo acontece com clubes de serviços e maçonarias.

Por Chico Sant’Anna

Foram quinze meses de estica e puxa. A Câmara Legislativa aprovou sob forte pressão a nova versão da Lei de Uso e Ocupação do Solo – Luos. Embora a lei anterior tenha sido sancionada, em janeiro de 2019, pelo atual governador Ibaneis Rocha, setores econômicos poderosos pediram por uma nova Luos, mais flexível do que a anterior, votada ainda na gestão de Rodrigo Rollemberg. Com o novo projeto, elaborado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano – Seduh, velhos pesadelos, como a abertura das atividades econômicas em bairros estritamente residenciais voltaram a assustar moradores.

Em meio ao isolamento social decorrente da Pandemia de Covid o projeto foi elaborado, com pouco diálogo com os moradores – salvo uma audiência on-line – e, praticamente, nenhum debate setorizado. Era como se a boiada também quisesse atravessar rapidamente sobre o projeto urbanístico de Brasília. Ao projeto elaborado pelo governo, 150 emendas foram apresentadas, tratando dos mais variados temas, que embora pudessem parecer simplórios, escondiam interesses milionários. Desde a facilidade de licenciamento em todo o DF para casas fúnebres capazes praticar o ato de mumificação de corpos, até a liberação de edifícios garagens no Lago Sul.

Os reais efeitos das novas regras da Luos ainda serão sentidos mais na frente, mas o tema que palpitou as manchetes dos jornais foi a possível autorização de atividades econômicas nas residências do Park Way, Lago Sul e Norte. De início, quiseram transparecer que o tema se referia apenas ao trabalho remoto, ao home-office que se popularizou em meio à Covid. Mas o efetivamente proposto era o uso de imóveis residenciais para a efetiva instalação de empresas. A pressão dos moradores dos três bairros foi grande, a CLDF teve que recuar. Um recuou não integral. Pelo caminho ficaram portas entreabertas. Escolas pré-existente a Luos poderão continuar a funcionar e até terem o ponto passado à frente. O mesmo acontece com clubes de serviços e maçonarias, que se somam às representações diplomáticas e empresas de advocacias, autorizadas em 2019.

Relator da Luos, o distrital Claudio Abrantes (saindo do PDT e indo pro PSD) diz que a CLDF buscou o consenso, ouvindo o GDF, o conjunto dos deputados e a comunidade. “Prevaleceu o critério urbanístico, um trabalho técnico, conseguimos a unanimidade das galerias aqui presentes. Todos saíram satisfeitos: empresários, moradores, trabalhadores. Certamente não é um trabalho perfeito, mas foi o esforço possível”.

Para o advogado Paulo Cunha, que assessorou as entidades dos três bairros, é preciso acabar com esse ciclo vicioso no DF de aprovar projetos sem qualquer preocupação com estudos prévios de demanda, capacidade da infraestrutura, investimento público, riscos ambientais e consulta prévia da comunidade impactada. Ao contrário do que aconselha o jurista, outros projetos urbanísticos já estão na fila pra chegar à CLDF. “Esse (Luos) foi o primeiro tempo, o jogo continua; no segundo tempo temos ainda o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB e o Plano Diretor de Ordenamento Territorial – PDOT. Nesses, vai ser ainda mais difícil obter o consenso” – adverte Cláudio Abrantes.