O poder civil no Brasil não deu conta do recado da promoção do desenvolvimento econômico sustentável, porque se rendeu ao neoliberalismo de Washington, a partir dos anos de 1980.
A China, ao contrário, a partir desse período, marcado pela decisão de Washington de puxar os juros para salvar o dólar, adotaram o nacionalismo econômico, para atrair investidores externos.
Puxaram para baixo os juros, o câmbio, os impostos e ampliaram o crédito. Adotaram a linha leninista de unificação nacional pela ditadura partidária, no comando político, e a flexibilização no campo econômico.
Enquanto isso, o poder civil  brasileiro se perdia na ditadura neoliberal baixada por Washington que levaria o capitalismo à bancarrota financeira em 2007-2008, responsável por manter a economia mundial em banho maria. 

Falência total do poder na Nova República: subordinação ao capital especulativo internacional inviabilizou a independência econômica nacional. O poder civil substituiu o poder militar em 1984, depois de 20 anos de ditadura militar, para ser o veículo da ditadura econômica, entronizada pelo Consenso de Washington, na sequência da crise monetária detonada por Tio Sam nos anos 1980, que quebrou a periferia capitalista em nome da salvação do dólar, sob impacto dos déficits fiscais americanos, ampliados para defender a democracia da expansão soviética. Em 1988, o poder civil promulgaria a Constituição cidadã, cuja principal função foi a de fixar, no artigo 166, parágrafo terceiro, item II, letra b, do texto constitucional, em forma de cláusula pétrea, a prioridade número um da política econômica, ou seja, o pagamento dos juros da dívida aos banqueiros, mecanismo jurídico introduzido de contrabando pelo peemedebista Nelson Jobim, um homem da banca. Embora a Nova República nascente tivesse a marca da cidadania, por dispor, na Constituição, no artigo quinto, as garantias e direitos individuais, em essência, o que ela determinava, como prioridade, em primeiríssimo lugar, era a satisfação dos interesses dos credores do Estado nacional. Configurou-se um Legislativo dominado por uma elite a serviço da burguesia financeira. Nascia a BANCOCRACIA brasileira, que colocaria uma cunha no poder civil, inviabilizando sua união, para, na restauração democrática, impedir o essencial, a independência econômica nacional. As crises econômicas e financeiras nacionais, sob o vai e vem do capitalismo global, de 1985 a 2014, que culminou na grande depressão de 2007-2008, aprofundaram a divisão do poder civil, adiando, para as calendas, a realização do sonho maior dos brasileiros, ter o Brasil para si, não para os outros. O poder civil foi levado de roldão pelo domínio implacável da BANCOCRACIA. Esta domina, implacavelmente, o Congresso sob governo de coalizão mediante modelo eleitoral calcado na pura corrupção. Até quando?

 

Por César Fonseca, publicado originalmente no portal Independência Sul-americana

Pobre Brasil!

Vinte anos de ditadura política e militar, de 1964 a 1984, e trinta anos de ditadura econômica, de 1984 a 2014! 50 anos de subordinação aos interesses internacionais.

Bem que Millor Fernandes, em resposta aos que achavam que Deus privilegiara o Brasil pelos seus imensos recursos naturais, em comparação aos outros, dizia o que o próprio Deus, segundo ele, formulou:

Os civis neorepublicanos (Sarney, Collor, FHC, Lula e Dilma), em trinta anos de governos democráticos, não tiveram competência para formular, de forma conjunta, tendo o foco no povo, um planejamento estratégico para alcançar o desenvolvimento nacional sustentável. Foram dominados pelos interesses do capital financeiro especulativo internacional, que conseguiram mantê-los divididos, para facilitar a exploração econômica nacional.

“Esperem, seus apressados, para ver os políticos  que vou colocar lá, para gerir esse grande patrimônio!”

A incapacidade de o poder civil de unir-se para promover o desenvolvimento nacional sustentável representa a causa principal do subdesenvolvimento político e econômico nacional.

Em 1964, em vez de unir-se em torno da Constituição democrática de 1946, os partidos principais – PSD, PTB e UDN – transformaram-se em lobo de si mesmos. Foram engolidos pelos interesses que os manipularam, ou seja, os interesses do capital americano, que financiou os militares, comprando a imprensa e formulando a “verdade” que precisavam divulgar. Contra a “bagunça”, estariam ajudando o País a se salvar do comunismo, a fim de preservar a família, a pátria e a liberdade.

Os civis, em 1964, Jango, JK e Lacerda, da mesma forma, não conseguiram formular uma união, para enfrentar o golpe militar, apoiado pelos americanos. Em 1966, defenestrados do poder, tentaram, arrependidos, unir-se em torno da Frente Ampla. Era tarde. A boca do imperialismo americano tinha sido aberta e engolira todo o mundo, dando as cartas para sustentar a desunião política nacional por meio do terror político ditatorial. Foram 20 anos de escuridão.

O patriotismo, último refúgio dos canalhas (Millor, de novo), acabou prevalecendo. Os ingênuos que, em 1964, deixaram-se dividir entre si (Lacerda, JK e Jango), tentaram, em 1966, dois anos depois do golpe, correr atrás do prejuízo.

Partiram para a formação da chamada Frente Ampla, a reformulação do poder civil, para lutarem por um programa mínimo. Pregaram anistia geral, nova Constituição, restabelecimento das eleições diretas, programas de reformas econômicas, com valorização dos salários e expansão do mercado interno, para fortalecer a base industrial brasileira, sucateada pelo plano de estabilização de Campos/Bulhões, sintonizado com Washington.

Os militares tomaram o poder para, segundo eles, restaurarem, rapidamente, o poder civil. Gostaram do poder militar. Nele, ficaram duas décadas, destruindo a economia, a política, a cultura, impedindo a união nacional em favor do desenvolvimento sustentável. A escuridão política que implementaram aprofundou a corrupção, a desunião e a concentração da renda no país, facilitando e ampliando a dominação externa. Traíram os ideais nacionalistas tenentistas da revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas, que inaugurou o Brasil moderno. Eles aprofundaram o atraso e facilitaram a corrupção que prometeram combater.

Os americanos, com os seus guarda-costas no poder, não deixaram que a Frente Ampla acontecesse. Jogaram com as armas da força, dos atos institucionais, dos decretos leis, dos partidos fantoches (Arena e MDB).

Essa superestrutura jurídica exasperou a juventude, levando-a à radicalização política. Era o que Washington e seus paus mandados queriam, o motivo para fecharem totalmente o regime político ditatorial.

O cerco americano se deu em toda a América do Sul. Washington, como demonstra o sensacional/sinistro livro de Luiz Cláudio Cunha, “Operação Condor – O sequestro dos uruguaios”, armou a rede das ditaduras sul-americanas. Nela, afogaram a democracia e a liberdade, de modo a facilitar o assalto das multinacionais às riquezas do continente em meio à divisão do poder civil.

Campos e Bulhões, gendarmes de Tio Sam, no comando da economia, promoveriam o que denominaram de sangria depuradora. Concentrado o poder em mãos militares, facilitaram o arrocho salarial, fiscal, creditício, criando as condições para impedir o crescimento do mercado interno, enquanto ampliavam as oportunidades para as multinacionais americanos irem destruindo a indústria nacional, impedindo a sua sustentabilidade, para garantir desenvolvimento com pleno emprego e inflação equilibrada, por meio do fomento à industrialização em termos agregados, para dar competitividade ao produto nacional. Foram os homens de Washington na terra de Euclides da Cunha.

É claro que a motivação maior dos americanos era impedir a independência econômica sul-americana, como revelaram as ações do embaixador Lincoln Gordon, dos Estados Unidos. Sua meta era clara: defender agressivamente os interesses das multis americanas contra o nacionalismo econômico janguista, expresso na tentativa de limitar remessas absurdas de lucros, nacionalizar empresas de energia elétrica e defender o petróleo.

Previsível volta de JK ao poder em 1965, pelo voto direto, assustava os americanos, com o discurso juscelinista de avançar no desenvolvimento da agricultura. Faria concorrência à produção agrícola americana, para gerar matérias primas básicas para a industrialização. A indústria nacional requeria a força da agricultura para dispor dos elementos necessários a sua expansão sustentável, no mercado interno e internacional. Seria a libertação da dependência externa de insumos e de capitais, fazendo o capital se reproduzir em casa.

Kissinger, o homem de Nixon para as relações externas, cuidou de rachar as forças políticas, na América do Sul, para que, por aqui, não ocorresse o exemplo chinês, de os militares unirem-se às esquerdas, a fim de fazer a revolução econômica nacionalista, impulsionando, contraditoriamente, o capitalismo.

O Brasil, com JK, em eventual repeteco no Planalto, caminharia no rumo das recomendações do grande empresário conde  Matarazzo.

Já no final do século 19, início do 20, Matarazzo, que destronara os americanos na produção de banha de porco, dizia que o Brasil tinha tudo dentro de si, para desenvolver, bastando, tão somente, decisão política, como havia acontecido com os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão, Inglaterra, França etc.

 

Em 1966, em uma mea culpa explícito, Lacerda denunciaria, em altos brados, que Castello Branco adotara política econômica entreguista. Os militares estavam destruindo o mercado interno e os salários, favorecendo os assaltantes das riquezas nacionais, mantendo as velhas relações de deterioração de trocas. Castello, Costa e Silva, Junta Militar e Medici, no período 1964-1974, abriram as porteiras nacionais para o capital americano.

Kennedy e Gordon articularam as forças americanas neoliberais para impedir o avanço nacionalista do governo Goulart, para que não restasse,no Brasil, qualquer resquício do pensamento getulista, que criou as bases do desenvolvimento nacional sustentável, com promoção do capital e do trabalho, gerando a industrialização, na linha pregada, desde o final do século 19, pelo conde Matarazzo. Jogaram para dividir as forças políticas internas, destruindo o poder civil.

Esse movimento de abertura se intensificaria depois que, em 1972, Washington descolaria o dólar do ouro, deixando-o flutuar. O dólar, diante dos elevados déficits americanos, decorrentes dos gastos militares, para sustentarem  a guerra fria contra o comunismo soviético,tendia à relativa desvalorização, fragilização e inflação. A partir daí, a política monetária americana se transformaria em pura especulação, diante do avanço da desregulamentação financeira, imposta pelo Banco Central, sob pressão de Wall Street.

A economia mundial, consequentemente, passaria a viver grandes volatilidades, sob impulso da financeirização econômica especulativa global. Para se livrarem dos perigos do déficit, responsáveis por desvalorizar o dólar, os árabes, em 1973, formaram o cartel da OPEP, mandando ver na subida do preço do petróleo.

Era a forma que encontraram para compensar as perdas nas trocas internacionais, pois, afinal, vendiam em dólar (desvalorizado) e pagavam em moedas europeias (valorizadas) suas importações. O aumento do preço do petróleo e a volatilidade do dólar, responsáveis por elevar o juro americano, para enxugar a base monetária global, afetada pela crescente desregulamentação financeira, jogariam a economia capitalista periférica global nas incertezas gerais.

Veja aqui a entrevista com Carlos Lacerda,emtão governador da Guanabara

Seria o princípio do fim do milagre econômico delfiniano, ancorado na poupança externa, que os juros altos americanos jogariam aos ares. O Governo Geisel, nesse contexto, iria formular a estratégia do capitalismo de estado, ancorado na criação de empresas estatais, para tentar resistir à nova política monetária americana, dada pelos desdobramentos da guerra fria.

O poder civil no Brasil não captou a profundidade da defesa do nacionalismo econômico defendido pelo grande empresário ítalo-brasileiro conde Matarazzo, que chegou a possuir perto de 350 indústrias, dada a sua crença segura no potencial econômico brasileiro. Jango quis ir na linha dele, promovendo as reformas econômicas, mas a espada de Dâmocles de Tio Sam decepou seu pescoço.

Geisel seria alvo de ataques semelhantes aos que sofrem hoje Dilma Rousseff, por partir para o dirigismo econômico para se defender da guerra cambial americana. O regime militar, sob Geisel, tentaria evitar os estragos produzidos pela volatilização do dólar, sob impulso de desregulamentação financeira, produtora de inflação mundial em moeda americana, exportada para a periferia capitalista subdesenvolvida.

Os militares, que já sofriam os desgastes gerados pelo fechamento político, impulsionador das resistências democráticas, entraram em estresse. Sob pressão popular, que havia fortalecido o PMDB em eleições legislativas, o poder militar ditatorial não aguentaria o tranco da política monetária imperialista americana, que havia detonado o aumento do preço do petróleo e as consequentes pressões inflacionárias.

O nacionalismo econômico geiselista, ancorado na expansão das empresas estatais, passara a ser duramente atacado pelo governo Carter (1977-1981), comandante de uma política de direitos humanos. Glauber Rocha, em 1977, escreveria, no Correio Braziliense, artigo intitulado “Myzérya do lyberalysmo”, que iria aprofundar o racha nas  esquerdas brasileiras.

Os árabes, diante da decisão do governo Nixon, de descolar o dólar do ouro, deixando a moeda americana flutuar, não pensaram duas vezes: uniram-se para criar a OPEP, adotando visão nacionalista, lançando mão das suas riquezas, para se defenderem da jogada monetarista imperialista de Tio Sam que jogaria o capitalismo periférico nas tensões inflacionárias. O poder civil,no Brasil, não teve a visão dos árabes. Dividiram-se e se danaram.

O deputado Zezinho Bonifácio, o líder da Arena, segundo Glauber, brandia, da tribuna da Câmara, o discurso nacionalista de Euclides da Cunha, enquanto Alencar Furtado, do PMDB, ancorava-se no liberalismo do “baiano cabeçudo”, Ruy Barbosa, neoliberal, constitucionalista, entreguista…

Tratava-se, portanto, na visão do genial cineasta de “Terra em transe”, de uma batalha ideológica, na qual conclamava a defesa do nacionalismo de Geisel, para vencer a volatilidade do dólar neoliberal de Carter, que exportava para o Brasil os estragos da inflação. Glauber via Geisel montado no cavalo de São Jorge, espetando o dragão inflacionário americano.

A inflação desatada pelo dólar avançaria célere sobre o governo Figueiredo. Em 1979, o liberalismo americano, mais uma vez atacado pelo crescente déficit público, que puxava a inflação, fortemente, nos Estados Unidos, ameaçando o dólar, levaria o Banco Central, o FED, à radicalização.

Diante da puxada violenta dos juros americanos por Paul Volcker, em 1979, Delfim, o homem do milagre econômico, em vez de levantar a voz em favor do nacionalismo, a fim de levar os militares a uma posição de resistência ao empobrecimento nacional, expresso na quebradeira da economia, preferiu se acomodar na velha tática de subordinar-se ao mais forte. Os militares, sob comando de Delfim, na economia, falaram grosso com o povo, impondo-lhes ditadura, enquanto falaram fino com Tio Sam, rendendo-se às suas determinações imperialistas.

Paul Volcker, presidente do BC, elevaria de 5% para 20,5% a taxa de juro. O objetivo de Volcker era enxugar a base monetária global encharcada de dólar, eurodólar, petrodólar, nipodólar e derivativos em geral, para recuperar a força da moeda de Tio Sam. Era o jogo imperial para que os Estados Unidos pudessem continuar dando as cartas como o detentor da moeda de reserva internacional nas trocas comerciais globais.

Indagado pelos jornalista sobre o que achava da decisão do BC americano, Delfim, cínico, respondeu de forma escapista: “É uma decisão dos Estados Unidos para salvar o mundo do comunismo.”

Quem devia em dólar, como o Brasil, quebrou, simplesmente. Dois anos antes, 1977-78, antevendo o perigo, a dupla Golbery-Geisel iniciaria a abertura política, colocando Petrônio Portela para negociá-la no Congresso. O presidente Figueiredo(1979-1985) transformaria a abertura na sua principal bandeira política.

Enquanto isso, Delfim Netto, czar da economia, mandou ver duas sobredesvalorizações cambiais, de 30% cada uma, diante da puxada violenta da prime rate americana de Paul Volcker. O czar apostaria todas as suas fichas nas exportações.

Ao mesmo tempo, ele jogou as estatais no mercado internacional, para tomar dinheiro emprestado, a fim de fechar déficits em contas correntes do balanço de pagamentos. O fim da ditadura estava à vista no compasso da crise monetária detonada por Washington.

Curta aqui a canção de Caetano Velozo, Soy loco por ti america

A inflação chegaria aos 200% ao ano, transformando-se no combustível político para o parto do PT, em 1980, diante das greves, comandada por Lula e companheiros. No rastro do movimento das Diretas Já, nasceria a Nova República.

Glauber Rocha deu um voto de confiança em Geisel quando ele tentou formular o capitalismo de estado para enfrentar os Estados Unidos, nos anos 1970. As esquerdas acabaram com o genial autor de “Terra em transe”, convicto de que os esquerdistas, sem conhecimento da real luta ideológica, que orienta a atuação do capital dominante, acabariam se rendendo aos capitalistas financeiros especulativos no ambiente da financeirização econômica global em marcha nos anos 1980. FHC e seu entreguismo dariam razão a Glauber.

O poder neorepublicano, porém, já nasceu financeiramente falido. Os credores externos obrigariam, a partir de 1985, os governos neorepublicanos de Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula e Dilma a se submeterem às determinações do Consenso de Washington, a nova ordem neoliberal.

Nesses trinta anos de ditadura econômica (1985-2014), exercida pelos credores, o Brasil subordinou-se ao câmbio sobrevalorizado. Essa seria a arma para segurar, mal e porcamente, a inflação, enquanto, paulatinamente, a indústria nacional seria destruída, sucateada.

Câmbio sobrevalorizado, dívidas internas e externas em expansão, juros altos para atrair poupança, a fim de fechar balanços de pagamentos deficitários e, claro, pressões

Millor Fernandes, o maior humorista nacional, não deu refresco para ninguém, nem para os civis, muito menos para os militares. Exercitou seu sadio ceticismo diante do poder, vendo neste a fonte de todos os males: “O poder corrompe; o poder absoluto corrompe absolutamente”. Nunca engoliu essa de Brasil Grande. Sentiu-o, sempre, com pés de barro, dominado pelos agiotas, desde que Cabral pisou em praias brasileiras em 1.500.

inflacionárias, acompanhadas de desmobilização crescente do patrimônio nacional, mediante as regras econômicas imperialistas ditadas pelo Consenso de Washington, eis o corolário que a economia brasileira, durante a Nova República, seguiu, como o caminho de Cristo para a morte no cadafalso.

O poder civil, na Nova República, não daria conta do recado essencial, ou seja, promover a libertação econômica nacional. Diante da reação nacionalista do primeiro governo neorepublicano ao garrote dos banqueiros, as forças políticas se racharam. Sarney pediu ao Congresso apoio de todos para enfrentar os credores, a fim de renegociar a dívida.

Dançou e ficou com a fama de caloteiro, embora tenha pago juros e correção da dívida. Ulisses Guimarães, o político mais forte da Nova República, naquele momento, mostrou-se um banana, não-estadista, fraco, subordinado às pressões dos banqueiros. Repetiria em 1985 o que fez em 1964, ou seja, apoiou a eleição indireta de Castello Branco, o homem de Washington, enquanto Tancredo Neves se absteria, não comparecendo à sessão.

Carter pressionou Geisel por uma política de direitos humanos. Falso. Por trás dessa formulação cínica, os americanos queriam acabar com a negociação do Brasil com a Alemanha em favor do programa nuclear.

A posição do PMDB, na hora dramática de Sarney, frente aos credores, representaria o ponto de partida da divisão do poder civil, na Nova República, responsável por fragilizar a economia, impossibilitando, dali em diante, a conquista do desenvolvimento sustentável.

Os governos neorepublicanos de Collor/Itamar e FHC entregariam, totalmente, a rapadura para os credores. Sob pressão total do Consenso de Washington, FHC afrouxou geral os controles e deixou o capital especulativo bamburrar, no compasso das novas regras ditadas de fora para dentro, expressas em superavits primários elevados, metas inflacionárias e câmbio flutuante.

O poder civil neorepublicano flexibilizou, totalmente, sua espinha dorsal. Assim como o poder civil, em 1964, sucumbiu-se a Washington, com a formação do bloco PSD/UDN e parte do PTB, para derrubar Jango, a partir de 1985, ocorreria, também, o racha no poder civil neorepublicano.

Volcker, quando o dólar fragilizou-se, em face dos déficits elevados de Tio Sam, não teve dúvida, puxou violentamente a taxa de juros para enxugar a liquidez mundial, jogando a periferia capitalista na quebradeira geral. Não estava nem aí.

A traição de Ulisses em relação à Sarney  proporcionaria, em seguida, racha no PMDB, que resultaria na formação do PSDB, com cores neoliberais mais firmes, adequadas às demandas do Consenso de Washington. O PMDB, desde então, passaria a ser a âncora da burguesia financeira, no Congresso, tornando-se ponto de equilíbrio entre o PSDB e o PT, que ganharia, com Lula, o poder, na derrocada tucana, em 2002, sob oneoliberal FHC.

O poder civil brasileiro, destituído de caráter forte, fragilizar-se-ia, por força das contingências internacionais, decorrentes da divisão internacional do trabalho, estabelecida a partir dos anos de 1980, entre Estados Unidos e China.

Ulisses votou em Castello Branco, na eleição indireta, em 1964, traindo Jango; em 1985, trairia Sarney, que precisou dele, da sua força política, para mobilizar as forças em favor da renegociação da dívida, para livrar o Brasil da quebradeira imposta pela decisão de Volcker. Mais uma vez, Ulisses não compareceu com sua coragem. Era o que lhe faltava diante dos poderosos banqueiros internacionais. Em 1964 e em 1985, ele demonstrou essa fragilidade contra as forças externas, embora enfrentasse com destemor os militares.

Ao contrário do poder civil brasileiro, rendido ao neoliberalismo, fragilizado pela crise monetária detonada pelos Estados Unidos, a partir de 1979, o poder comunista, na China, partiria para  a nacionalização econômica. Os chineses jogaram brilhantemente: desvalorizaram sua moeda, adotaram juros, impostos e créditos baratos, para importar empresários de todo o mundo, a fim de se instalarem, na China, sob compromisso de exportarem a produção, ganhando o mercado mundial.

Os americanos chiaram, mas os chineses não deram pelota. Resultado: aumentaram as exportações chinesas para o mercado mundial, especialmente, o americano, ao longo dos últimos 30 anos, conquistando sucessivos superavits comerciais, que fizeram, nesse período, a pujança econômica da China.

O Brasil de Lula navegaria no aumento das exportações de commodities para os chineses. Os americanos, para corrigirem as distorções na economia dos Estados Unidos, produzidas pelo avanço chinês, adotaram providências monetárias, cujas consequências iriam afetar o desenvolvimento do capitalismo periférico, no qual se insere o Brasil.

Durante as últimas três décadas, a indústria brasileira iria sofrer aquilo do qual se livraram os chineses, ou seja, os estragos produzidos pelo câmbio sobrevalorizado, inibidor das exportações, adotado pelo BC brasileiro para tentar minimizar, sem conseguir, os estragos decorrentes das decisões monetárias praticadas por Washington para enfrentar o câmbio sobredesvalorizado chinês!

O mineiro do PSD, aliado de Getúlio, de Jango e das forças nacionalistas não conseguiu chegar ao poder em 1985. A morte não deixou. Não saberíamos dizer se ele enfrentaria os banqueiros de peito aberto, em nome do nacionalismo econômico. Sarney, seu substituto, tentou, com Dilson Funaro, Belluzzo e João Manoel, no Ministério da Fazenda, mas não tiveram o apoio de Ulisses para essa jornada nacionalista. Dançaram.

O poder civil neorepublicano democrático brasileiro, politicamente, dividido e fragilizado, ao contrário do poder civil chinês, unificado na ditadura do partido comunista, acabaria não cumprindo o essencial, ou seja, a promoção da independência econômica nacional.

O governo petista, a partir da crise mundial, em 2007-2008, adotaria o discurso de Jango, em 1964, de cores nacionalistas, ao mesmo tempo que faturava exportações de commodities para a China. Embora sob pressão dos credores para manter câmbio sobrevalorizado, inibidor da industrialização, o governo petista apostou no mercado interno e na valorização dos salários, no momento em que o capitalismo nos países ricos entrou em crise de realização do capital especulativo.

O governo Dilma, na sequência do de Lula, tentou, sem convocar as forças populares, fazer uma reforma política, para sustentar a redução dos juros, que chegaram, em 2011, a 2% reais, descontada a inflação. Seria a arma para melhorar a performance do setor industrial brasileiro, mas a força dos neoliberais se mostrou poderosa.

A indústria nacional, mediante erraticidade da política cambial, imposta pelos credores, continuou frágil, sem liderança competente, para fazer o discurso nacionalista, alinhado ao do governo, afetado pelas tensões inflacionárias.

Na América do Sul, Getúlio, nos anos 30-40-50 já havia antecipado aos chineses, pregando o nacionalismo. Mas, os americanos o levaram ao suicídio e seus substitutos dobraram-se às manobras imperialistas, que dividiriam o poder civil no país, levando-o ao colapso neoliberal.

A eleição presidencial de 2014 é um ponto de inflexão do desenvolvimento nacional. Os bancos centrais dos países capitalistas ricos, mas em crise, pressionam o governo Dilma para render-se àquilo do qual os chineses fugiram, para se tornarem fortes, ou seja, das práticas neoliberais.

Diante dessa pressão internacional, o poder civil, em 2014, se mostra dividido, como ocorrera em 1964, rachado pela ação dos interesses externos.

O mote da CPI da Petrobras chega na hora exata para fortalecer os interesses externos, que não querem, de jeito nenhum, um segundo mandato dilmista, que, certamente, insistiria no nacionalismo econômico, que derrubou Jango.