Foto de Edgard Thomas

Comissão Especial, reunindo senadores e deputados federais, aprovou de uma só tacada a redução de duas importantes Unidades Federais de Conservação existentes no DF: a Floresta Nacional – Flona e o Parque Nacional de Brasília – PNB, que abriga a Água Mineral.

Por Chico Sant’Anna

A semana que termina ficou marcada por perdas significativas ao meio-ambiente do Distrito Federal. Nas duas pontas do Eixo Monumental as articulações parlamentares, nem sempre dignas e quase sempre movidas por interesses escusos, trouxeram danos irreparáveis. Na ponta oeste do Eixo Monumental, a Câmara Legislativa aprovou numa sessão noturna o texto da Lei de Uso e Ocupação do Solo – LUOS, alterando destinações de imóveis e também dos limites de construção em muitos deles. Foi a vitória do concreto sobre o verde.

Na outra ponta do Eixo Monumental, uma Comissão Especial, reunindo senadores e deputados federais, aprovou de uma só tacada a redução de duas importantes Unidades Federais de Conservação existentes no DF: a Floresta Nacional – Flona e o Parque Nacional de Brasília – PNB, que abriga a Água Mineral. As medidas foram inseridas no parecer do senador Dário Berger (MDB-SC) à MP 853, que tratava especificamente de imóveis do INSS.

Como dizem no jargão parlamentar, colocaram um jabuti no telhado. O GDF nega ter solicitado qualquer uma das medidas e tudo indica que elas foram inseridas para regularizar a situação de grileiros que ocupam as duas áreas.

A Flona é composta por quatro áreas distintas. A MP extingue as áreas 2 e 3.

Pela decisão tomada – que ainda deve ser ratificada pelos plenários da Câmara e do Senado – a Flona perde 4.067 hectares. Composta de quatro glebas, localizadas nas regiões administrativas de Taguatinga, Brazlândia e Estrutural, as glebas de número 2 e 3 deixarão de fazer parte da Flona.

A área 2 está na Estrutural, nas proximidades das Chácaras Santa Luzia, onde a justiça já determinou a desocupação de uma área de 300 metros a contar dos limites do Parque.

A área 3 vem sendo ocupada irregularmente e o maior núcleo habitacional é a Colônia 26 de Setembro. O mesmo local em que o governador eleito Ibaneis Rocha (MDB) prometeu construir com recursos próprios as casas derrubadas pela Agefis.

Flona

A Floresta Nacional de Brasília atua como importante proteção tanto para os cursos d’água que desaguam na barragem do Descoberto, quanto na de Santa Maria. Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMbio, essas ocupações não possuem saneamento básico e a coleta de lixo praticamente não existe, colocando em risco de contaminação os mananciais existentes no local.

Por lei, a Flona foi criada com a missão de promover o manejo de forma sustentável dos recursos naturais renováveis, a manutenção e proteção dos recursos hídricos e da biodiversidade do Cerrado.

O volume d’água dos mananciais por ela preservado representa o consumo de 65% da população do Distrito Federal, segundo o ICMBio. Ali estão espécies da flora e da fauna ameaçadas de extinção, como o palmito-juçara, o pássaro papa-moscas-do-campo e o tatu-canastra. Trechos da unidade de conservação abrigam trilhas para caminhada e circuitos de mountain bike abertos ao público.

Parque Nacional

Criado em 1961, o Parque Nacional de Brasília abriga a Água Mineral, cuja gestão esteve a ponto de ser privatizada por decisão do ministro do Meio-Ambiente, Sarney Filho – que será o futuro secretário do Meio-Ambiente do DF. Pelo parecer aprovado ele deve perder uma área denominada Núcleo Rural Boa Esperança II – NRBEII .

No interior do PNB está a barragem de Santa Maria, segundo maior reservatório do sistema de abastecimento d’água de Brasília, atendendo principalmente moradores do Plano Piloto, Lago Norte e Varjão. O PNB nasceu com 30 mil hectares de área e foi ampliado para 42,3 mil hectares, em 2006, mediante a Lei 11.285/06 aprovada pelo Congresso Nacional.

Em 2010, o então deputado federal, Geraldo Magela (PT-DF), apresentou projeto de lei buscando reduzir em 53 há – cerca de 50 campos de futebol – as dimensões do Parque. A reação popular foi grande e o projeto do deputado petista não andou.

Agora, em uma medida provisória que tratava especificamente de imóveis de propriedade do INSS, o relator da MP, senador Dário Berger (MDB-SC), decidiu incluir artigos que reduzem as duas Unidades de Conservação no DF, bem como de outro Parque, o de São Joaquim, em Santa Catarina.

Publicada originalmente na coluna BRASÍLIA, POR CHICO SANT’ANNA, no semanário Brasília Capital.

GDF não pediu

As justificativas oficiais são fracas. No texto em exame no Congresso Nacional é dito que a alteração no perímetro do Parque irá proporcionar uma economia de R$ 25 milhões nas obras de acesso ao bairro Taquari, através de uma ligação Torto-Colorado, e regularizar a situação do Núcleo Rural Boa Esperança, localizado no interior do PNB, nas proximidades do Lago Oeste.

Na secretaria de Comunicação do GDF, a informação é que o governador Rodrigo Rollemberg nada solicitou nesse sentido. No Departamento de Estradas e Rodagens, que constrói a ligação Torto Colorado, o informe é que o acesso ao Taquari já está sendo concluído, sem afetar a área do Parque.

Cerca de 300 famílias moram no Boa Esperança que hoje se assemelha mais a um condomínio urbano de classe média do que instalações de produtores rurais.

Tudo indica que foi o lobby dessa comunidade que moveu as alterações ora aprovadas. Negociações já estavam sendo realizadas entre o GDF e o ICMBio. A ideia era uma permuta de terras pela qual o Parque seria ampliado na sua parte Sul e liberaria a parte alvo da MP. Na prática, ao aprovar a medida provisória o Congresso Nacional atravessou uma negociação e não garante mais a reposição de área a ser perdida.

A mesma situação é a da Flona. O grupo de trabalho entre o GDF e o ICMbio negociava a desafetação da gleba 2 e parte da 3, porém com ressalvas ambientais para a preservação de nascentes e córregos, como a área do Bananal, que a partir da crise hídrica de 2017, passou a ser mais um manancial fornecedor de água para os moradores do DF.

Em nota técnica, o ICMBio afirma ser inconstitucional a mudança de áreas de Unidade de Conservação por meio de Medida Provisória, bem como a introdução numa MP de temas alheios ao objetivo original da proposta: o famoso jabuti. Disse ainda, que a proposta deveria ter sido debatida tanto com o Instituto, quanto com a população de Brasília.

Único parlamentar de Brasília na Comissão Mista, o deputado Izalci Lucas, votou favoravelmente à redução das unidades de conservação. Foto Roque Sá/Agência Senado.

Único parlamentar de Brasília na comissão mista, o deputado Izalci Lucas – PSDB votou a favor das reduções das duas unidades. Izalci que atuou na chamada MP da Grilagem – que facilitou a regularização de áreas da União ocupadas irregularmente -, em conversa com a imprensa, afirmou que, embora reconheça que o método utilizado não é o convencional, alguma coisa precisaria ser feita para regularizar a situação dos moradores que ocupam áreas na Flona e no PNB.

Da parte do governo do GDF que termina não há informes de movimentações para derrubar as emendas de redução das duas unidades de Conservação. Por enquanto, apenas o ICMBio e ambientalistas estão se movimentando para evitar esse prejuízo ao povo do Distrito Federal.