A lei 13.880, de 2019, prevê a apreensão de arma de fogo registrada ou sob posse do agressor em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

 

Por Chico Sant’Anna

A interdição judicial do deputado distrital João Hermeto (MDB), decretada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), com base na Lei Maria da Penha, que o obriga a manter um distanciamento minimo de 300 metros da sua ex-mulher, Vanusa Lopes, pode ganhar novos capítulos. Uma representação ao ministério público solicita que ele entregue as armas que tiver em seu poder.

Ex-companheira do distrital Hermeto, a advogada Vanusa Lopes, registrou ocorrência com base na Lei Maria da Penha.

Ocorrências policiais registradas por Vanusa Lopes, ex-companheira do parlamentar, que é egresso da Polícia Militar, relatam que entre 2001 e 2002, ela foi alvo de atos de violência, sendo que, em uma das ocasiões, segundo a denunciante, ele teria apontado uma arma para a cabeça dela. O distrital nega as acusações.

Leila do Volei foi relatora no Senado da lei que obriga o recolhimento de armas de indiciados na Lei Maria da Penha. Foto de Jefferson Rudy/Agência Senado

Legislações

A lei 13.880, de 2019, prevê a apreensão de arma de fogo registrada ou sob posse do agressor em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. O texto legal, de autoria do deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) e que no Senado Federal teve como relatora, Leila do Volei (PSB-DF), estabelece que quando do registro da ocorrência, a autoridade policial deve verificar se o eventual agressor possui registro de posse ou porte e apreender imediatamente a arma de fogo do agressor como uma das medidas protetivas à vítima. Além disso, deve-se notificar a instituição responsável pela concessão do registro ou da emissão do porte.
No caso especifico do Distrito Federal, existe ainda outro marco jurídico: o Decreto 39.851, assinado pelo governador Ibaneis, em maio desse ano. Ele determina que servidores pertencentes aos quadros da Polícia Civil, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros Militar e do Sistema Penitenciário do Distrito Federal, quando indiciados em inquéritos policiais por motivo de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Lei Maria da Penha, ou estiverem com medida protetiva judicial decretada, terão sua(s) arma(s) de fogo recolhida(s) até a conclusão do processo judicial respectivo.
Hermeto é sargento da reserva da Polícia Militar do Distrito Federal e, como integrante da reserva estaria sujeito às mesmas obrigações do militar da ativa. Não há, contudo, notícia de que ele tenha entregue as armas que possui. Por isso, o vice-presidente da Federação dos Conselhos de Segurança do Distrito Federal (Feconseg), Marcelo de Carvalho, encaminhou representação ao ministério público requerendo que o MP apure se a medida cautelar de recolhimento de armas já foi executada e, em caso negativo, que o MP adote os procedimentos necessários para que as armas por ventura existentes sejam recolhidas. A Feconseg é a entidade que representa a totalidade dos Conselhos de Segurança do DF (um para cada região administrativa). Os Consegs são entidades comunitárias, de caráter consultivo e deliberativo e de cooperação voluntária para com a política de segurança pública do Distrito Federal.
A senadora Leila do Volei parabenizou a iniciativa da Feconseg em cobrar das autoridades o cumprimento da lei e lamentou que os novos procedimentos legais ainda não estejam nas rotinas das delegacias, ainda mais em Brasília, “Essa é uma lei importante, principalmente para nossa cidade, onde as taxas de feminicídio crescem todos os meses. “A lei deve ser para todos, independentemente do cargo ou situação da pessoa. Se ele foi indiciado, foi enquadrado na Lei Maria da Penha, as armas devem ser recolhidas imediatamente.” – ressaltou a parlamentar. Para o deputado distrital Leandro Grass (Rede) a questão é simples. “Se existe a lei e o decreto, o delegado deve cumprí-los, independentemente de quem sejam as partes envolvidas.

Cfemea

Para a socióloga Guacira Cesar de Oliveira, fundadora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), é uma “infelicidade ter um agressor de mulheres como deputado distrital.” “Aqui no DF, o número de feminicídios só cresce. É imperioso coibir a violência e fazer cumprir a Lei Maria da Penha. O Deputado Distrital Hermeto tem de ser obrigado a entregar as suas armas. E o poder público precisa ser ágil, incisivo e eficiente para proteger as mulheres. Lutamos como ativistas feministas para que o poder público não seja lento, tolerante, omisso, enfim, para que não atue como cúmplice da violência contra as mulheres” – registrou ela.

A secretária da Mulher do GDF, Ericka Filippelli – nora do ex-vice-governador Tadeu Filippelli – e presidente do MDB-Mulher, prefere não se pronunciar sobre o caso até decisão final da Justiça.

Silêncio do MDB

Hermeto chegou a ser indicado pelo MDB para compor a CPI que apura o Feminicídio no Distrito Federal. Só se afastou diante da denúncia da esposa e da reação de setores da sociedade e de colegas de Legislativo. Todos esses fatos não sensibilizaram o diretório do MDB-DF, presidido pelo também presidente da CLDF, Rafael Prudente. O partido se fechou em copas em relação às denúncias contra Hermeto. O deputado é e se elegeu pelo extinto PHS, com 11.552 votos, migrou, a convite do governador Ibaneis, para o MDB e de quebra foi aquinhoado com o comando das administrações regionais da Candangolândia, Núcleo Bandeirante e Park Way.
Nem mesmo o setorial MDB-Mulher, que tem por missão articular as ações para políticas de empoderamento e de defesa dos direitos da mulher se posicionou. Comandado pela secretária da Mulher do GDF, Ericka Filippelli – nora do ex-vice-governador Tadeu Filippelli – o MDB-Mulher afirma por meio de sua assessoria de imprensa, que irá esperar a apuração dos fatos que está a cargo da justiça.

Ao mesmo tempo em que emudece diante das denúncias contra o distrital, Ericka Filippelli critica a decisão do Supremo Tribunal Federal em assegurar o trânsito em julgado antes de levar a prisão um condenado. “Meu temor quanto a decisão do STF – diz ela nas redes sociais – estende-se aos inúmeros agressores que violaram os direitos de mulheres e que podem ser colocados em liberdade. Que Deus as proteja”. Em outra mensagem, ela convida as mulheres para participarem do curso promovido pela Secretaria da Mulher sobre “Legislação brasileira e marcos internacionais de proteção e promoção da igualdade de gênero”. Chega a ser paradoxal o silêncio do MDB-Mulher sobre um caso especifico de integrante do partido e o estimulo a formação sobre leis que protegem a mulher.

Base parlamentar
Todo esse tratamento diferenciado a Hermeto se deve à necessidade do GDF ter maioria de votos na Câmara Legislativa. A Ibaneis Rocha o risco de perder o voto de quem hoje é o vice-líder de governo na Câmara Legislativa. Para o grupo Filippelli também não há interesse em perturbar Hermeto. No frágil equilíbrio interno pelo poder interno no partido, apertar os calos do ex-sargento poderá levar ele em definitivo para o colo de Ibaneis.