Foto de Alexandre Motta, distribuída pelo gabinete de Paula Belmonte.

Toda de branco, como se fosse a fada madrinha, a deputada federal Paula Belmonte (Cidadania) foi a cidade do Gama, distante uns 40 km do Congresso Nacional, entrou no campo e anunciou apoio financeiro ao time da casa. A Belmonte Sports, empresa da família, fará um aporte financeiro no clube, disse a assessoria da deputada, sem especificar quanto será.

Por Chico Sant’Anna

O mundo do futebol e o da política sempre andaram bem próximos. Nacionalmente, pessoas com ambições políticas se metiam no futebol para aumentar o eleitorado e vice-versa. Bons exemplos foram Márcio Braga, do Flamengo; Eurico Miranda, do Vasco; Zezé Perrella, do Cruzeiro. Mesmo com um futebol ainda incipiente, o Distrito Federal também tem seus cartolas. José Roberto Arruda se colou no Gama. Entrou até com ação na Justiça para manter seu time na primeira divisão. Luiz Estevão fundou o Brasiliense e o advogado Luís Felipe Belmonte, primeiro suplente de Izalci Lucas, no Senado, é o dono do Real Brasília.

Essa turma toda é apelidada de cartola. Denominação que pode representar poder, mas também pode ser um adjetivo pejorativo. “Dirigente de clube esportivo, tido geralmente como pessoa que se aproveita da sua situação para obter privilégios e ganhos” – diz o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.

Agora, o mundo do futebol, pelo menos o candango, tem a sua Cartola. A deputada Paula Belmonte (Cidadania) foi pessoalmente ao Bezerrão, ninho do periquito, dizer aos jogadores do Gama que os salários atrasados deles seriam pagos.

O Gama terminou a primeira fase da Série D do brasileirão com a segunda melhor campanha entre todos os clubes da competição, atrás apenas do rival Brasiliense. Segundo o semanário Brasília Capital, depois que o presidente do Gama, Weber Magalhães, ligou para pedir ajuda de Luís Felipe Belmonte, presidente do rival Real Brasília, as redes sociais esquentaram o termômetro da negociação.

“Torcedores do Gamão lotaram de mensagens as páginas da torcida e da deputada federal Paula Belmonte, esposa do benfeitor Luís Felipe. Algumas delas prometendo apoio político: “Se você salvar o Gama, trabalho de graça em 2022”, disse um dos apaixonados” – atesta o semanário.

Toda de branco, como se fosse a fada madrinha, a deputada federal Paula Belmonte foi a cidade do Gama, distante uns 40 km do Congresso Nacional, entrou no campo e anunciou apoio financeiro ao time da casa. A Belmonte Sports, empresa da família, fará um aporte financeiro ao clube, disse a assessoria da deputada, sem especificar de quanto será.

Bate nas canelas

O apoio anunciado por Paula chega em um momento crítico para o Gama. “Somos adversários apenas dentro de campo. O futebol de Brasília precisa de união para crescer”, afirmou o marido, Luís Felipe Belmonte, presidente do rival Real Brasília Futebol Clube e dirigente da Belmonte Sports.

A investida dos Belmontes sobre o Gama, contudo, é como um carrinho sem bola no ex-governador Roberto Arruda, responsável, inclusive, por fazer um novo estádio Bezerrão, inaugurado com a seleção de Portugal, com Cristiano Ronaldo e tudo.

No mundo da política, Flávia Arruda (PL), esposa do governador cassado na Caixa de Pandora – joga em time oponente à Paula Belmonte. E as duas poderão chegar em 2022 num mata-mata visando o Buriti.

Flávia Arruda ganhou recentemente maior visibilidade quando o Centrão indicou seu nome para presidir a toda poderosa Comissão do Orçamento do Congresso Nacional.

Entrando em campo desportivo, Belmonte avança seu meio de campo e, pelo menos na realidade candanga, consegue melhorar seu posicionamento diante da torcida – ou parte dela. Paula Belmonte dá, assim, um passo ao mundo da cartolagem

Cartola

Cartola é um tipo de chapéu masculino com topo alto em forma de cilindro; antigamente utilizado em situações formais. Contam os historiadores que a cartola nasceu na segunda metade do século XIX, para diferenciar homens e mulheres que trabalhavam nas companhias de navegação. Dessa forma, foi projetado um chapéu de maior estatura para os homens e as mulheres continuaram a portar uma espécie de quepe.

Na indumentária já se projetava uma desigualdade de gêneros e se acentuava o comando masculino.

Da navegação pra terra firme foi um pulo. As cartolas passaram a ser assessório obrigatório para os homens – sempre os homens –  que desejassem demonstrar poder e importância: políticos, nobres, empresários.

De assessório à designação, a expressão cartola passou a ser sinônimo de “homem de importância” – sempre no masculino -, segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.

No mundo dos esportes, o termo cartola nasce para designar o mascote do Fluminense. O Fluminense sempre teve a imagem de ser de um clube de elite, e não das massas. Daí o termo pó de arroz. O primeiro mascote do time foi o Cartola Fidalgo, desenhado a pedido do “Jornal dos Sports”, em 1943, pelo cartunista argentino, Lorenzo Mollas.

De lá para cá, o termo passou a constar do dicionário desportivo, como sendo sinônimo de dirigente, diretor ou presidente de time de futebol. O personagem de Mollas passou a designar qualquer dirigente futebolístico.

Na política, conta o jornalista Fernando Martins, da Gazeta do Povo, os cartolas são aqueles “donos” do trampolim partidário por meio do qual candidatos com potencial eleitoral podem chegar mais alto. Mas a realidade demonstra que o mundo da política está eliminando a intermediação e passa a assumir diretamente o comando do futebol. Assim, não há risco de gol contra, de traições ou mudanças de padrinhos.

Lavagem de dinheiro

Nessas transformações todas, um outro tipo de cartola se aproximou do futebol. Aquele que queria lavar o dinheiro obtido irregularmente.

Conta a revista americana The Economist que o futebol passou a ser uma “máquina de lavagem de dinheiro e fraude” à disposição de criminosos, muito por causa do pouco interesse das autoridades governamentais e do futebol em combater esse tipo de prática.

Escândalos pipocaram no mundo inteiro, inclusive envolvendo dirigentes brasileiros. A escolha de países sedes de grandes eventos como a Copa do Mundo e as Olímpiadas teriam sido algo do toma lá dá cá.

Em 2009, uma investigação em mais de 20 países, concluiu que a indústria do futebol estava sendo usada por quadrilhas criminosas para lavagem de dinheiro e tráfico de pessoas.

Segundo informou a Agência Brasil – órgão oficial do governo federal – o empresário e ex-senador Luiz Estevão foi denunciado pelo Ministério Público Federal no Distrito Federal (DF) por usar o time de futebol Brasiliense para supostamente lavar dinheiro entre 2001 e 2005. De acordo com a denúncia, Estevão usou contas bancárias do clube, criado por ele em 2000, para ocultar e dissimular a movimentação de dinheiro proveniente de atividades criminosas.

Não por menos, a Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei n.º 9.613/98) se preocupa diretamente com o mundo dos esportes. Em seu artigo 9º, traz o rol de atividades consideradas sensíveis à lavagem, ou seja, as atividades econômicas com maior possibilidade de serem utilizadas em um esquema de branqueamento de capitais.

Dentre elas, o inciso XV, passou a prever também as “pessoas físicas ou jurídicas que atuem na promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou eventos similares”.

Em artigo sobre Lavagem de dinheiro para o Canal Ciências Criminais, a especialista em Direito Penal e Criminologia, Ana Paula Kosak, alerta que “muitos clubes de futebol com dificuldades financeiras acabam ficando mais vulneráveis ao aceitarem investimentos de fundos duvidosos, simplesmente pelo fato de fazerem menos exigências dos investidores, por necessitarem de apoio financeiro”.