O que vemos é que, progressivamente, a população padece do desemprego e vem empobrecendo. Como se isso não fosse o bastante, é estratosférica a alta dos preços dos alimentos considerados “básicos”, limitando o poder de compra de grande parte da população ou, por vezes, demandando dela a substituição dos alimentos em sua mesa. Assim, sutil e paulatinamente, a insegurança alimentar avança!

Por Fátima Sousa*

Segundo o “Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil”, lançado recentemente, a incerteza quanto ao acesso aos alimentos e o comprometimento da qualidade da alimentação têm alcançado a casa de 28,0% dos brasileiros. A restrição quantitativa aos alimentos alcança atualmente, de forma avassaladora, mais de 30% dos domicílios, dentre os quais 15,5% têm convivido com a fome. São mais de 33 milhões em situação de fome atualmente no Brasil e 125 milhões de pessoas vivendo diuturnamente com a insegurança alimentar batendo em suas portas.

A que se deve isso? À crise sanitária sem precedentes que vivemos e, sobrepostas a ela, duas crises ainda maiores: política e econômica. As iniquidades da garantia do direito humano a uma alimentação adequada e saudável, expressas pelo acesso desigual e insuficiente a renda, bens e serviços e por políticas públicas ineficazes, que por vezes preterem os que mais necessitam, não somente têm contribuído para o constante perpetuar-se das desigualdades, como também fizeram com que nosso país retornasse ao Mapa da Fome.

E no Distrito Federal?

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em setembro de 2020 mostraram que pelo menos 49 mil famílias do DF vivem em situação de fome, agravada pelas dificuldades econômicas da pandemia, e 319 mil domicílios estão em situação de insegurança alimentar.

Em entrevista ao Correio Braziliense, o governador Ibaneis Rocha (MDB) afirmou que a fome em 2021 seria um grande problema a enfrentar (Fonte:). Mas o que tem sido feito? Enquanto esse cenário é “analisado”, famílias lutam por uma refeição com arroz, feijão e carne. Em alguns lares, doações e auxílios têm sido as únicas possibilidades para se ter mais que água na geladeira.

O que vemos é que, progressivamente, a população padece do desemprego e vem empobrecendo. Como se isso não fosse o bastante, é estratosférica a alta dos preços dos alimentos considerados “básicos”, limitando o poder de compra de grande parte da população ou, por vezes, demandando dela a substituição dos alimentos em sua mesa. Assim, sutil e paulatinamente, a insegurança alimentar avança!

O direito humano a uma alimentação adequada e saudável, de qualidade e em quantidade suficiente, um preceito constitucional, vem sendo negligenciado e perdendo espaço nas agendas. A precarização da vida, por sua vez, vem recebendo lugar de destaque.

Urge a necessidade de uma agenda de reorientação das estruturas econômicas, políticas e sociais, bem como a construção de políticas públicas permanentes, focadas na educação e na ampliação da oferta de trabalho e renda, para que saiamos da inércia na garantia do direito humano a uma alimentação adequada e saudável, inércia que traz como consequência, a duras penas, a necessidade de famílias lidarem com a fome.

Mudar esse cenário requer a adoção de políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição, acesso e consumo de alimentos seguros e de qualidade, além de promoção da saúde e de uma alimentação adequada e saudável, de forma equânime e universal. E a quem cabe fazer isso? A cada um de nós! Juntos, podemos fazer mais pelo nosso Distrito Federal. Governantes são eleitos pelo povo e governam para (e com) o povo.

* Enfermeira sanitarista, professora associada do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília. Doutora honoris causa pela Universidade Federal da Paraíba e pós-doutora pela Université du Québec à Montréal. http://lattes.cnpq.br/7405541534944144