Contas eleitorais irregulares pode ensejar pedido de cassação dos mandatos de Damares Alves (Republicanos) e Bia Kicis (PL). Eventual perda de mandato de Damares beneficiaria sua principal oponente nas eleições, Flávia Arruda (PL). Já a cassação de Kicis ampliaria a bancada do PT. Fotos da Agência Brasil.

Por Chico Sant’Anna

A bancada federal do DF, eleita para 2023, arrisca mudar radicalmente. Dois fortes expoentes do bolsonarismo candango correm o risco de não tomarem posse enquanto parlamentares, devido a irregularidades em suas contas eleitorais. Damares Alves (Republicanos), que obteve para o Senado Federal 714.562 votos (44,98% dos votos válidos); e Bia Kicis (PL), a mais votada para a Câmara, com 214.733, tiveram suas contas questionada pelo Ministério Público Eleitoral (MPE) e pelo Setor de Contas do Tribunal Regional Eleitoral do DF (TRE-DF). Caso o TRE acate o parecer do MPE e rejeite as contas, isso criará base legal para pedido de cassação das duas parlamentares. Isso ocorrendo, no caso do Senado Federal, a beneficiada seria a deputada Flávia Arruda (PL), a segunda mais votada. A eleição não seria anulada, pois Damares não chegou a ter mais de 50% dos votos. Procurada, Flávia não quis comentar a situação.

Já na Câmara Federal, eventual cassação de Bia Kicis rebuliçaria a composição de toda a bancada, pois seus votos seriam considerados nulos e haveria a necessidade de se recalcular o coeficiente eleitoral. Dependendo do resultado, até mesmo a eleição do Coronel Alberto Fraga (PL) poderia ser afetada. Fraga obteve 28.825 e foi eleito graças à boa votação de Kicis. Eventual cassação de Kicis favoreceria dois nomes do PT: Ruth Venceremos e Policarpo.

No PT-DF, não se verificou nenhuma movimentação jurídica nesse sentido. Mas a situação preocupa Fraga. “Se isso acontecer, seria um desastre. Eu perco o mandato, também. Minha votação foi pífia, eu dependo da validade dos votos dela. Mas eu duvido que isso venha a acontecer. Ficaria muito escancarada uma perseguição aos bolsonaristas, mas temos que ficar atento” – avalia.

A impugnação das contas não gera uma cassação automática dos mandatos conquistados, explica o advogado André Maimoni, especialista em Direito Eleitoral. “Mas a gravidade dos fatos pode levar que o próprio Ministério Público requeira a cassação ou qualquer outro partido ou cidadão. A Justiça Eleitoral tem sido rigorosa, se verifica uma tendência de maior firmeza, principalmente, quando a glosa recai sobre recursos do Fundo Eleitoral que, na prática, são recursos públicos pagos pelo contribuinte” – comenta ele.

Contas glosadas

No parecer, o MPE recomenda ao TRE-DF a reprovação das contas da campanha de Bia Kicis pelo uso supostamente incorreto de R$ 182,3 mil provenientes do Fundo Eleitoral (FE) para pagar despesas com combustíveis, locação de mesas e cadeiras para os comícios, material de propaganda eleitoral, serviços de militância e aquisição de fogos de artifício.

Segundo o procurador regional eleitoral, Zilmar Antonio Drumond, não há amparo legal para o uso de Fundo Eleitoral para a compra de material pirotécnico. Além disso, também foi identificada a emissão de uma nota fiscal de uma rede de combustíveis, no valor de R$ 12,4 mil, valor não declarado na prestação de contas da parlamentar.

“De modo que, frustrada a auditabilidade e rastreabilidade dos recursos financeiros públicos aplicados na campanha eleitoral pela ausência de demonstração de sua regular utilização, além de sua expressividade no contexto das contas apresentadas (11,60% do total das despesas contratadas), cumpre desaprovar as contas de campanha, determinando-se a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional”, relatou Drumond.

Damares

As contas da ex-ministra da Mulher foram glosadas pelo mesmo procurador. De acordo com ele, cerca de R$ 595 mil (R$ 105 mil provenientes do Fundo Partidário e R$489 mil do FE), gastos na campanha, estão com situação “irregular”. É dinheiro usado na propaganda eleitoral, remuneração de militantes, combustível e contratação de segurança particular. Esse último item foi pago com dinheiro do FE, sem que houvesse previsão legal para tanto. Ao todo, Damares Alves gastou R$ 3,9 milhões de recursos durante a campanha

Também aqui, Drumond relata que foi “frustrada a auditabilidade e rastreabilidade dos recursos financeiros públicos aplicados na campanha eleitoral” e afirma não ter sido provada “sua regular utilização, além de sua expressividade no contexto das contas apresentadas (15,64% do total das despesas)” e pede igualmente a devolução do valores ao Tesouro Nacional.

O que elas dizem

Tanto Bia Kicis como Damares Alves negam irregularidades.

Em nota, a assessoria da deputada afirma que as falhas apontadas são meramente formais e todas sanáveis. “O parecer deixou de considerar os esclarecimentos que já fizemos acerca dos contratos de prestação de serviços na campanha. Estamos confiantes que, ao final, teremos as contas aprovadas”, disse.

A assessoria de Damares afirmou ao UOL Notícias, que parte das inconsistências encontradas se devem a falhas formais, como valores, datas e informações incorretas nos documentos apresentados. Que foram apresentados as cópias de contratos e materiais de campanhas que justificariam as despesas. Quanto à segurança pessoal, a justificativa é que a ex-ministra sofreu ameaças durante a campanha e que a Constituição Federal garante a proteção máxima ao indivíduo o que justificaria a contratação de serviços de segurança para sua campanha