Planaltina, Itapoã, Riacho Fundo II, Ceilândia, Paranoá, Recanto das Emas, Samambaia e Fercal estão dentre as localidades de consumo mais baixos ao longo dos últimos anos, se contrapondo aos Lagos Sul e Norte, Plano Piloto, Park Way, Jardim Botânico e Vicente Pires. O Lago Sul, sorvendo 400 litros per capita/dia, é o campeão de consumo d’água, superior em, aproximadamente, 160 litros d’água a mais que o Lago Norte, vice-campeão.

Por Chico Sant’Anna

São Pedro foi condescendente nessa temporada de chuvas que vai chegando ao fim. Os reservatórios estão cheios até à boca, mesmo assim, técnicos e autoridades estão preocupados com o consumo d’água no Distrito Federal. Além de um crescimento de 30%, entre 2006 e 2020, segundo a Adasa, o abastecimento não se dá de forma equitativa. Na capital das desigualdades socioeconômicas, também a água potável chega em mais abundâncias aos ricos do que aos pobres. Pelo menos nove regiões administrativas apresentam consumo abaixo do mínimo necessário.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera 110 litros per capita como volume ideal para o consumo mínimo diário necessário para suprir as necessidades básicas do ser humano. Entretanto, em mais da metade das regiões administrativas do DF, seus moradores não alcançam esse padrão. As cidades onde o consumo é perigosamente baixo são exatamente aquelas em que a maioria de seus moradores possui baixa renda e já enfrenta outros problemas sociais, como nutrição e saúde. Já nas RAs mais abastadas, o consumo chega a ser o dobro do valor padrão proposto pela OMS.

Além da diferença do volume de consumo, há uma diferença da estrutura de acesso à água potável. Em muitas casas de baixa renda os pontos de acesso à água são poucos quando não se limitam a uma única torneira. Também muitas dessas casas são desprovidas de caixa d’água. Assim, em dia de problema de abastecimento por parte da Caesb, essas residências ficam a seco. Enquanto que nas localidades de maior renda, há reservatórios capazes de manter o abastecimento sem transtorno por mais de um dia. Isso, sem contar com a existência de piscinas, espelhos d’água, irrigação de jardim, dentre outros equipamentos.

Planaltina, Itapoã, Riacho Fundo II, Ceilândia, Paranoá, Recanto das Emas, Samambaia e Fercal estão dentre as localidades de consumo mais baixos ao longo dos últimos anos, se contrapondo aos Lagos Sul e Norte, Plano Piloto, Park Way, Jardim Botânico e Vicente Pires. O Lago Sul, sorvendo 400 litros per capita/dia, é o campeão de consumo d’água, superior em, aproximadamente, 160 litros d’água a mais que o Lago Norte, vice-campeão. Na lanterninha estão Riacho Fundo 2 e Itapuã, abaixo do que recomenda a OMS.

Memória hídrica

A memória hídrica do brasiliense parece ser curta. Depois de vivenciar uma crise sujeita a racionamento do abastecimento d’água, o consumo voltou a crescer. O consumo humano –não se inclui a agricultura, comércio e indústria – responde por 70% desse crescimento. Como salienta o ambientalista Eugenio Giovernardi, o GDF não se convenceu da necessidade de criar políticas para a criação de reservatórios para a guarda da água da chuva, sejam eles residenciais ou mesmo governamentais. Dessa maneira, o DF desperdiça as águas que caem no período das chuvas e tem que se apoiar nas sete frágeis bacias hidrográficas que possui. A do Paranoá, responsável pelo abastecimento do Plano Piloto, Lagos Sul e Norte, Cruzeiro, Águas Claras, Riacho Fundo, dentre outras RAs, é a que maior crescimento de consumo vem apresentando.

As Regiões Administrativas com os maiores níveis de consumos (acima de 10 milhões de m³) são Plano Piloto, Ceilândia, Taguatinga e Águas Claras. A razão desse elevado consumo, em grande parte, se deve ao fato de serem as mais populosas. A Adasa ressalta, ainda, que no Plano Piloto há uma maior pressão, pois recebe diariamente uma população não residente, que só volta à casa após o horário de trabalho. Na outra ponta, onde a torneira é mais seca, estão Arniqueiras, Pôr do Sol e Fercal.

Algumas regiões estão em processo de crescimento populacional, mas outras como Plano Piloto, Lago Sul e Norte, Sudoeste/Octogonal, Guará e Candangolândia, apesar de apresentarem população estáveis, tem apresentado crescimento do consumo hídrico individual superior a 6%, ao ano, o que demonstra claramente uma mudança de comportamento. Menos economia com a água.

Preocupação

Preocupação maior tem sido com a expansão urbana atendida pelo sistema de abastecimento Sobradinho/Planaltina, que atende também a São Sebastião, e que em 2018 apresentava a vazão de 505 litros por segundo. É na área de influência desse sistema que tem se verificado “aumento acentuado de condomínios habitacionais de características urbanas” segundo relatório do Pdot, apresentado pela secretaria de Desenvolvimento Urbano. Diante dessa realidade, tem sido crescente o número de captações subterrâneas de água, nem todas legais, que afetam indiretamente a recarga dos reservatórios usados para o abastecimento tradicional.

Esses dados vieram a público em decorrência dos estudos para o novo Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) em fase de discussão e que será submetido à Câmara Legislativa para definir as áreas que doravante poderão ser ocupadas e de que maneira, bem como as que deverão ser preservadas. O abastecimento d’água é um limitador da expansão urbana, mas é necessário que autoridades e sociedade compreendam isso. Há várias propostas de adensamento urbano em áreas detentoras de nascentes, como a Serrinha do Paranoá. Urbanizar essas áreas representa, de um lado, menor produção e, de outro, maior consumo d’água. O Distrito Federal que teve que passar a beber água do Lago Paranoá e a importar água de Corumbá, precisa compreender que esse não é um recurso infinito. Assim, necessário é que no novo Pdot proteja as áreas de recargas de aquíferos, zonas de transição da vida silvestre para o bem de todos os brasilienses, em especial os mais sedentos.