A privatização da gestão da emissora deve acontecer em novembro e terá a validade de um ano. Nos editais divulgados até agora não há qualquer exigência de experiência pregressa na gestão de veículos de comunicação ou de ente cultural, nem é definido que tipo de programação será executada.

 

Por Chico Sant’Anna

 

Na onda do que fez na Saúde, o governador Ibaneis Rocha começa a privatizar a gestão na Cultura. A primeira vítima é a FM Cultura de Brasília, 100,9 Mhz. Criada a fórceps em 1988, a rádio nunca teve ao longo de sua vida uma projeto especifico de radiodifusão, a exemplo de outras emissoras públicas e educativas. Já foi a rádio das bandas de rock da Capital, mas também já foi do sertanejo. Agora, o futuro da sua proposta cultural dependerá da Organização Social que assumir sua gestão. O Edital do “Termo de Colaboração” já foi lançado pela secretaria de Cultura e pegou muita gente de surpresa, inclusive os onze profissionais e os voluntários que lá trabalham. Pelo Edital, que não define que modelo de radiodifusão será exercido, o GDF pagará por ano R$ 1 milhão para que uma organização social assuma a gestão da emissora.

Além da gestão administrativa, a OS será responsável pela programação, cujos parâmetros não estão pré-definidos, curadoria e modernização da emissora. Não está claro no que consiste esta curadoria. A OS colaborativa será responsável pela aquisição de novo mobiliário, criar um portal pra emissora, atualizar os programas de informática, “dinamizar a programação jornalística plural”, coordenar a rede de voluntários amigos da emissora, dentre outras tarefas. No edital não foi especificado se a emissora continuará a operar na sua sede no Espaço Cultural Renato Russo.

O contrato terá a duração de um ano, mas no edital não está claro se os bens adquiridos pela OS, ao final do contrato, estarão incorporados ao patrimônio da emissora pública. Também não está claro o destino dos servidores (jornalistas, administrativos e radialistas) que bravamente fazem a emissora acontecer. Além do aporte de R$ 1 milhão dos cofres públicos, a OS deverá assegurara a injeção de R$ 1,5 milhão em captação externa, seja por meio de patrocínio direto, seja por meio de apoio cultural.

A privatização da gestão da emissora deve acontecer em novembro. Nos documentos públicos divulgados até agora não há qualquer exigência de experiência pregressa na gestão de veículos de comunicação ou de ente cultural.

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Patinho feio

A Cultura FM caiu no colo do GDF em 1988, por obra e ação do governo Sarney. A Universidade de Brasília requisitava para ela a concessão da frequência, mas o então ministro das Comunicações, Antônio Carlos Magalhães, não queria entregar uma rádio aos “esquerdistas”, que sob a tutela do reitor Cristovam Buarque, comandavam a UnB. Foi ai que José Aparecido de Oliveira, então governador do DF, recebeu de ACM a missão de solicitar para a Capital a mesma frequência. Coube ao jornalista D’Alambert Jaccoud – que acumulava as pastas da Cultura e do Trabalho – elaborar um projeto de radiodifusão às pressas. Como a lei exigia que emissoras educativas fossem geridas por Fundações, a emissora foi entregue a extinta Fundação Cultural do DF.

Ao longo desses 31 anos, nunca a Cultura recebeu a atenção e o orçamento que merecia. Os governadores se alternaram, os partidos também, mas a Cultura sempre ficou sob a responsabilidade de abnegados, muitos dos quais trabalham gratuitamente como voluntários. Não foram poucas as vezes que os simpatizantes da rádio fizeram rifas e festas para a aquisição de material básico de radiodifusão. Os primeiros computadores que lá chegaram foram doações de equipamentos ultrapassados da Terracap.

FBC

O governador Cristovam Buarque chegou a nomear uma comissão especial para tratar dos destinos da emissora. Formada por representantes do GDF, da Unesco, da UnB e das entidades representativas de Jornalistas e Radialistas, a comissão sugeriu a criação da Fundação Brasiliense de Comunicação – FBC, que além da rádio, seria responsável por editar o Diário Oficial do DF, a época entregue a uma empresa jornalística privada; gerir a publicidade oficial do DF e ser o ponto de partida para a exploração do canal público ao que o Distrito Federal tem direito na rede de TV a Cabo. Como receita, além de ser remunerada pelos serviços do DODF, a FBC receberia – como recebe a Empresa Brasileira de Comunicação – EBC – a comissão publicitária referente a veiculação da propaganda oficial, em média, 20% do valor da veiculação.

Mesmo aprovado pelas áreas de Educação, Comunicação Social, Cultura e Consultoria Jurídica, o projeto-de-lei da FBC nunca foi enviado por Cristovam Buarque à Câmara Legislativa. Foi então apresentado pela deputada Maria José Maninha – à época da base de Cristovam. Aprovado em todas as comissões, o projeto chegou pra ser votado em plenário entre o primeiro e o segundo turno das eleições de 1998. Foi então que forças ocultas o retiraram de pauta no dia da sua votação. Valdomiro Diniz – porta-voz da decisão -, era o assessor parlamentar de Cristovam, mas o então governador nega de pé junto que tenha sido contra a proposta e que tenha mandado retirá-la da pauta de votação.

O certo é que a Rádio Cultura continua até hoje brigando pra sobreviver e é incerto seu futuro nas mãos da iniciativa privada, num momento que a radiodifusão comercial padece no Brasil inteiro.