Õnibus terceirizado pelo GDF ficou preso na água sob um viaduto na Ceilândia, provocando a morte de Giovana Moraes de Oliveira. Foto Correio Braziliense

Por Chico Sant’Anna

 

Não faz muito tempo, os brasilienses ficaram estarrecidos com a morte de Giovana Moraes de Oliveira, uma garotinha de seis anos, que voltava para casa num ônibus escolar contratado, de forma terceirizada, pelo Governo do Distrito Federal.

Segundo relatou o Correio Braziliense, era fim de tarde, do dia 8 de outubro, quando o motorista de um ônibus escolar cheio de crianças decidiu atravessar uma área alagada em um viaduto de Ceilândia. O ônibus enguiçou e a água começou a invadir o veículo. As crianças subiram no teto para esperar por socorro. Giovana, no entanto, ficou presa ao cinto de segurança e não conseguiu sobreviver. O motorista foi indiciado por homicídio culposo, quando não há intenção de matar.

O acidente revelou uma série de problemas de gestão: problemas na execução de vias públicas sem a devida estrutura de escoamento, problemas na limpeza das redes de captação de águas pluviais, problemas na capacitação de profissionais que atendem ao público e que não possuem noção do risco que enfrentam e que expõem aqueles que deles dependem, problemas em uma secretaria de Educação, que peca por não se valer dos programas federais de transporte público e que prefere fazer o jogo do empresariado local e terceirizar serviços que deveriam ser prestados pelo próprio estado.

Em países símbolos do capitalismo e do liberalismo, como nos Estados Unidos, transporte escolar é tratado como coisa séria e a responsabilidade em geri-lo é da escola ou da autoridade educacional. No governo petista de Agnelo, transporte escolar é instrumento de repasse de recursos públicos à iniciativa privada – nem sempre qualificada. Recursos que deveriam estar sendo aplicados pelo próprio GDF.

Uma centena de ônibus escolares repassados pelo governo federal aguarda no pátio da TCB o momentode entrar em operação. Foto de Chico Sant'Anna, pelo celular.
Uma centena de ônibus escolares – os amarelões  repassados pelo governo federal -, aguarda no pátio da TCB o momentode entrar em operação. Foto de Chico Sant’Anna, pelo celular.

Amarelões

O Distrito Federal possui 580 mil estudantes matriculados na rede oficial de ensino. Destes, 37 mil são transportados diariamente por meio de 590 linhas de ônibus contratadas a cinco ou seis empresas locadoras de ônibus. Elas dividem uma verba anual de 60 milhões de reais repassados pelo GDF. Enquanto isso, cerca de cem ônibus zero quilômetro, novinhos em folha, estão estacionado no pátio da TCB esperando a burocracia governamental para começarem a transportar a garotada com mais conforto e segurança.

Os ônibus foram adquiridos recentemente com apoio do programa Caminho da Escola do governo federal. Criado em 2007, só agora o Distrito Federal decidiu se valer dos benefícios desse programa datado ainda no governo Lula. De 2008 a 2010, o governo federal apoiou a compra de mais de 12 mil ônibus escolares para as unidades da federação. Goiás ficou com 60 veículos. Brasília: nenhum.

“Marcaram bobeira”, justifica um gestor da secretaria da Educação – referindo-se a seus antecessores -, ao tentar explicar por que Brasília demorou tanto tempo para usufruir de um programa que existe há, pelo menos, seis anos.

O programa Caminho da Escola se propóe a renovar a frota de veículos escolares dos estados para garantir a segurança dos escolares, mas o GDF "marcou bobeira". Foto de Chico Sant'Anna, pelo celular
O programa Caminho da Escola se propõe a renovar a frota de veículos escolares dos estados para garantir a segurança dos escolares, mas o GDF “marcou bobeira”. Foto de Chico Sant’Anna, pelo celular

O mais irônico é que a página oficial do programa Caminho da Escola explica que o programa tem por objetivo “renovar a frota de veículos escolares, garantir a segurança e qualidade ao transporte dos estudantes e contribuir para a redução da evasão escolar”.

Ou seja, se o GDF não tivesse “marcado bobeira”, e seguido as recomendações do Ministério da Educação, possivelmente, Giovana ainda estaria saltitante por ai, para a alegria dos amiguinhos e familiares.

Agora um convênio foi firmado com a estatal Transporte Coletivo de Brasília – TCB com objetivo dela fazer circular os primeiros veículos. A secretaria de Educação nega que o convênio tenha sido motivado pelo acidente com Giovana e informa que 32 ônibus, dos cem que estão no pátio, começarão a transportar nesta segunda quinzena de novembro alunos portadores de necessidades especiais. Os veículos foram adaptados às necessidades das crianças e contarão, além do motorista, de um monitor abordo.

Os demais 68 não têm data certa para circular, mas serão destinados ao ensino integral e, nestas circunstâncias, a regional de ensino de Brazlândia deve ser a principal contemplada, pois é por lá que o governo pretende introduzir o ensino integral na rede pública. Estes veículos novos ainda não farão o transporte casa-escola dos alunos, mas tão somente o transporte para atividades fora da escola, tipo ir a um museu, jardim zoológico, dentre outros destinos.

Na segunda quinze de novembro, já quse no fim do ano escolar, 32 ônibus começaram a circular para atender a alunos portadores de necessidades especiais. Contratos com tercerizadas ainda deve durar dois anos. Foto de Chico Sant'Anna, pelo celular.
Na segunda quinze de novembro, já quse no fim do ano escolar, 32 ônibus começaram a circular para atender a alunos portadores de necessidades especiais. Contratos com tercerizadas ainda deve durar dois anos. Foto de Chico Sant’Anna, pelo celular.

Contratos

Pelos próximos dois anos, os donos das empresas de transporte escolar podem ficar tranqüilos, pois não vão perder a boquinha no GDF. Os cálculos oficiais apontam que ao longo de 2014 o GDF vai receber mais 200 veículos, sendo a metade doada pelo governo federal e o resto por conta dos contribuintes locais.

Ficaria faltando, portanto, a substituição de 290 ônibus particulares. Não há previsão de quando a frota será totalmente substituída, mas isso não deve acontecer antes de 2015. Os contratos assinados pelo GDF duram por mais dois anos, sem contar eventuais aditivos, e em tempos eleitorais, recomenda a cartilha não irritar um segmento tão importante quanto os dos empresários de transporte.

 O preço que a família de Giovanna pagou foi muito caro, mas pelo menos que sirva de lição para que o governo do Distrito Federal não volte a adotar políticas que colocam em risco a vida de seus