Na área verde em frente a MSPW quadra 14, próxima ao Balão do Aeroporto, tratores derrubam árvores do cerrado para dar lugar a nova via. Foto por celular
Texto e fotos por Chico Sant’Anna, publicado originalmente na revista Brasília 247

Desde o primeiro governo Roriz, cada terreno de mansão prevista por Lúcio Costa se transformou num condomínio de oito casas. Uma explosão imobiliária e populacional brutal, sem que tenham sido tomadas as precauções de planejamento urbano.

 

Os moradores do Park Way estão estarrecidos com a agressão ao meio-ambiente provocada pelas obras de construção da via expressa de ônibus que ligará o Gama e Santa Maria ao Plano Piloto, conhecida como BRT, na sigla em inglês de buz rapid transit. Na altura da quadra 14, próximo ao Balão do Aeroporto, os tratores rasgaram o chão sem dó e nem pena. Árvores do cerrado, já consolidadas e com mais de cinco metros de altura, foram destroçadas, relembrando as tristes imagens do desmatamento da nossa Amazônia.

No lugar de construir uma nova faixa contigua à Estrada Parque Dom Bosco,GDF optou por fazer via independente onde até agora era área verde.

Além das sucupiras e cabiúnas, outras espécies nativas e exóticas da região foram por terra. Para nocautear de vez o meio-ambiente, há outro desmatamento promovido pelas autoridades públicas na área do aeroporto JK, que segundo se especula, será destinada a abrigar os taxistas que servem aquele local. O desmatamento já foi alvo de interdição pela Justiça, pois ali é uma área de preservação ambiental.

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No trecho da estrada Parque Dom Bosco que vai do entroncamento da BR-40 (ali denominada Epia), na altura da floricultura do Núcleo Bandeirante, ao Balão do Aeroporto, a via expressa do BRT deixa de ser uma faixa no canteiro central da rodovia para ganhar ares de uma segunda via, independente. Para isso, rasgou-se toda a área verde existente em frente da quadra 14 do Park Way. Não houve por parte das autoridades nem da empreiteira executante da obra a preocupação em transplantar as espécies nativas para outro local, a exemplo do que foi feito quando da execução das obras do metrô no Eixo rodoviário, o Eixão. Os tratores avançaram até mesmo no feriado de 7 de setembro, pondo por terra em segundos aquilo que a natureza levou décadas para constituir.

Pequena vereda existente no local pode ser afetada pela movimentação de terras ao seu redor. Nascentes poderão ser aterradas pelalinha do BRT

No local existem nascentes d’água, formando uma mini vereda, que mesmo nesta época seca do ano é forte o suficiente para deixar a vegetação verde, como se fora um oasis. Nem palmeiras faltam. Nas placas das obras, não existem referências à existência de um relatório de impacto ambiental. Igualmente, os moradores não foram alvo de audiência pública.

Outra preocupação da comunidade é que além da via expressa, um canteiro de obra mostra que haverá uma edificação. Ninguém sabe exatamente o que é, pois, como afirmamos antes, nem o GDF, nem a administração regional, nem as empreiteiras do consórcio BRT tiveram a preocupação de debater com os moradores os projetos a serem executados e, quem sabe, receber sugestões da comunidade.

No rastro das obras polêmicas do BRT, restou apenas a destruição da natureza do cerrado.

Especula-se que será uma estação de transbordo ou de integração do sistema de transporte coletivo. E a simples especulação de isso ser verdadeiro, já revoltou os moradores do Park Way, que nas redes sociais demonstram a sua insatisfação. Em vão, as duas associações de moradores existentes no bairro já provocaram a administração regional e o deputado distrital Chico Leite – a quem é atribuída a indicação do atual administrador, José Estrela.

As preocupações da comunidade não param por ai.

A BR-40 divide ao meio o Park Way em duas fatias. Do lado Leste da rodovia, estão as quadras de 14 a 29. Do Oeste, as de número 6 a 13. Atualmente, com o trânsito intenso da via, já é difícil acessar de um lado a outro. Malabarismos e peripécias automobilísticas são necessários, por exemplo, para quem deseja ir da quadra 28 para o Núcleo Bandeirante, principal apoio de comércio e serviço do bairro.

Há muito, os moradores reivindicam uma travessia mais segura. Agora, o temor é que o problema se agrave, a exemplo do que ocorreu na Estrada Parque Taguatinga. Lá, ao longo da via, só existem duas oportunidades de travessia para carros: na altura da entrada do Guará e na de Águas Claras.

Com a via expressa do BRT, os retornos existentes na BR-40 deverão desaparecer. Seriam necessários trevos e viadutos para propiciar o deslocamento de uma banda à outra do bairro. Os moradores já enviaram solicitações de informações à administração regional, mas nem mesmo com a lei do acesso à informação foram respondidos.

A própria administração regional parece estar às margens desta obra, que tem previsão para ficar pronta em julho do ano que vem. Segundo o portal do GDF, somente no dia 20/8, muito depois do início da construção da via expressa, é que representantes do Departamento de Estradas e Rodagens (DER) e do Consórcio BRT – Sul, responsáveis pela construção do Expresso DF, estiveram reunidos com a Administração Regional do Park Way para a apresentação da execução das obras na BR-40.

Com base nas maquetes de propaganda, moradores do Park Way temem ficar ilhados pela BR-40 e impedidos de atravessar de um lado ao outro do bairro. Foto: Portal GDF.

O temor maior é que os pontos de travessia se limitem aos trevos já existentes no viaduto do Catetinho – no entroncamento para o Gama – e no trevo de ligação da Estrada Parque Dom Bosco com a Epia, próximo ao Núcleo Bandeirante. Além disso, segundo as maquetes divulgadas na propaganda da obra, as vias de serviço, paralelas à rodovia, que hoje são de mão dupla, permitindo a mobilidade em ambos os sentidos – Park Way-Plano Piloto e Park Way-Gama – passariam a ter sentido único. O lado oeste teria sentido Gama e o lado Leste, direção Plano Piloto.

A inexistência de múltiplos pontos de travessia e a aplicação de sentidos únicos nas vias de serviço resultariam numa restrição brutal na mobilidade de veículos no Park Way, bairro que não conta internamente com transporte coletivo adequado e onde faltam passeios públicos e ciclovias.

A comunidade do Park Way representa hoje uma população de, aproximadamente, 60 mil habitantes. Pagam um IPTU caro, equivalente ao do Lago Sul. O bairro ainda conserva algumas características de área rural, como projetado por Lúcio Costa, quando previu para que fosse um setor de mansões suburbanas e que formaria parte do cinturão verde do DF. Ainda é possível avistar pica-paus, araras, papagaios, capivaras, sagüis… Ainda há natureza.

Hoje é um grande aglomerado de casas. Desde o primeiro governo Roriz, cada terreno de mansão prevista por Lúcio Costa se transformou num condomínio de oito casas. Uma explosão imobiliária e populacional brutal, sem que tenham sido tomadas as precauções de planejar abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto, vias públicas adequadas ao fluxo de veículos. Até a energia elétrica é falha e não são poucas as reclamações de falta de energia ou de equipamentos domésticos queimados pelas descargas elétricas.

Hoje, setores do Park Way penam com a falta d’água, falta de segurança e de equipamentos púbicos. Para piorar a situação, a última versão do PDOT, segundo moradores, autorizou a destinação de áreas atualmente verdes do bairro a “empreendimentos imobiliários de uso múltiplo”. Esta nomenclatura técnica, ainda na versão de moradores, seria a permissão para a implantação de estabelecimentos comerciais e até de pequenas indústrias na região, antes projetada para ser um cinturão verde.