
Por Chico Sant’Anna
As eleições de 2014 terão um diferencial, em relação aos pleitos passados. As escolhas que os eleitores fizerem para o GDF e para a Câmara Distrital determinarão o modelo de ocupação do solo no Distrito Federal e também da proposta de mobilidade urbana da Capital Federal. Vários projetos de lei e de organização urbana estão em fase de elaboração e análise.
Tanto o governo Agnelo, quanto o governo de Arruda, terminaram com escândalos em relação a propostas de leis e marcos legais que definem os gabaritos (tamanho das construções) e áreas a serem ocupadas pela indústria imobiliária. Com Agnelo foi o PPCUB e a LUOS. Já com Arruda foi a votação do Plano Diretor e de Ordenamento Territorial do Distrito Federal- Pdot-DF (Lei Complementar nº 803/2009).
O Pdot define áreas de expansão habitacional e estratégias de regularização de locais consolidados. Foi exatamente por ocasião da apreciação do Pdot pela Câmara Distrital, que eclodiu o escândalo da caixa de Pandora, o Mensalão do DEM, como ficou popularmente conhecido. Os rumores da época apontavam uma bonificação da ordem de R$ 500 mil para a cada distrital que viesse aprovar o Pdot proposto por Arruda.
De 1987 a 2009, a área urbana do DF cresceu 132%%. O Pdot de Arruda, em vez de reverter, manteve essa tendência. O plano autorizava uma expansão urbana desmedida, muitas vezes superior ao necessário para atender as demandas de moradia da população até 2020, que elimina áreas rurais e acelera a degradação ambiental. Foi este marco jurídico, por exemplo, que aprovou a criação do setor habitacional Catetinho, na região administrativa do Park Way, embora o local seja uma área de proteção ambiental e abrigue as nascentes dos córregos que formam o Lago Paranoá.
Na ocasião, partidos com bancadas na CLDF e que faziam oposição a administração Arruda/Octávio (PT, PDT, PSB e PC do B) se comprometem a questionar a nova lei junto ao Ministério Público do DF e ao Federal e ao Poder Judiciário. Consideravam que o Pdot sentenciava à morte a Área de Proteção de Mananciais do Catetinho e colocava em grande risco as outras APMs, uma vez que dava poderes ao governador de extingui-las via decreto.
Arruda caiu com as imagens dele recebendo dinheiro do Mensalão do DEM. Nas eleições de 2010, apenas o destino do Bairro do Catetinho ganhou evidência nos debates dos candidatos: Roriz propôs a Cidade da Saúde, a candidatura Agnelo (na qual estavam Rollemberg e Pitman) defendia uma nova cidade para 70 mil moradores. O Psol foi o único contra e propunha conservar a área, transformando-a num parque ambiental e vivencial.
Votos apurados, PT, PDT, PSB e PC do B, associados ao PMDB e outros pequenos partidos, assumiram o GDF. Um novo projeto de PDOT é enviado à CLDF, em 2011. A Lei Complementar nº 803/2009 exigia uma atualização, pois 60, dos 1.668 dispositivos foram julgados inconstitucionais, especialmente em relação aos princípios de legalidade e uso social da propriedade.
Luiz Estevão
Na nova versão do Pdot, áreas rurais transformadas em urbanas passaram a ter até cinco anos para apresentar projeto de parcelamento de terras ao governo. O dispositivo, de autoria de vários deputados distritais cutucou diretamente o ex-senador cassado e condenado a mais de 30 anos de reclusão, Luiz Estevão. Dono da Fazenda Santa Prisca, autorizada a virar área urbana em 1997, viu a contagem regressiva disparar. Como o novo Pdot foi aprovado em 2011, até 2014, ele tem que apresentar seu plano de ocupação da área, já apelidada de Oklândia.

Pela lei, quem deveria fazer este trabalho de planejamento seria Luiz Estevão, proprietário da maior parcela da terra. O Distrito Federal, via Terracap, é dono de 20% da região (3,4 mil hectares). Entretanto, Luiz Estevão não teve que se preocupar. Foi o GDF quem gastou recursos públicos para elaborar o plano urbanístico de um a área que irá beneficiar a indústria imobiliária. Detalhe, o anúncio dos projetos foi feito 24 horas após a realização da Conferência das Cidades, onde o assunto não foi sequer mencionado.
As normas aprovadas pela Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano do GDF preveem autorização para que os empresários ergam prédios de até 15 andares. Este novo bairro deve receber ainda o Centro Financeiro Internacional, que o governador Agnelo Queiroz, sem licitação, encomendou a empresa Jurong, de Cingapura.

Santos e Santas
Informalmente chamado de Santa Barbarão novo empreendimento – cuja maior propriedade denomina-se Santa Prisca – fica às margens da DF -140, entre São Sebastião e Santa Maria. O nome definitivo pode ser cidade Tororó, tendo em vista estar localizada na região do Núcleo Rural do Tororó, onde se encontram as últimas nascentes de água ainda a não exploradas pela Caesb. Além do grupo de Luiz Estevão, fazem-se presentes na localidade empresas como a Via Engenharia, JC Gontijo, Construções Acnt Ltda. e Domínio Engenharia e Imobiliária. Não haverá um sistema especial de abastecimento d’água da poligonal. O bairro está inserido na área de abrangência do Sistema de Abastecimento São Sebastião/Paranoá, que já enfrenta dificuldades para atender à demanda de São Sebastião.


Segundo o jornal Correio Braziliense, a Oklândia ocupará um terreno de 17 mil hectares, hoje de matas de cerrado, às margens da DF-140, entre São Sebastião e Santa Maria. Em longo prazo, a estimativa é de que a população da nova cidade chegue perto de um milhão de habitantes, um terço da população atual do Distrito Federal. “A quantidade de habitantes, então, será demograficamente maior do que 13 capitais brasileiras, entre elas João Pessoa, Florianópolis, Macapá e Campo Grande. O número também supera a soma de moradores de três regiões do DF — Brasília, Ceilândia e Taguatinga, que, juntas, totalizam 811 mil indivíduos” – diz o jornal.

Não há perspectivas de equipamentos de mobilidade urbana. O Bairro terá ligações com o Plano Piloto pela Ponte JK e pela EPIA, já engarrafada com o trânsito proveniente do Gama, Santa Maria e Entorno Sul. Há pressões para que uma via, já denominada Estrada do Roncador, rasgue o Jardim Botânico de Brasília, criando um atalho até às proximidades da Ponte Costa e Silva.
Como a área é basicamente de propriedade particular, o início da ocupação acontecerá de acordo com a vontade da iniciativa privada. Os empresários acreditam que no final deste ano alguns empreendimentos já devam estar sendo erguidos na região.

Verticalização
Além da cidade do Tororó, se houver vitória da reeleição do atual governo, ou se saírem vitoriosas as chapas de Arruda ou Pitman, a tendência de adensamento urbano e verticalização do Distrito Federal deverá ter sequência.
Foi na administração Arruda/Paulo Octávio que Águas Claras, inicialmente prevista para ter no máximo oito andares, pulou para prédios de até 30 pavimentos. O Guará que tinha limite de seis, também cresceu rumo ao céu. No momento, cidades como Samambaia e Gama vivenciam a verticalização com espigões crescendo a todo vapor, sem que suas ruas internas tenham condições de abrigar tantos novos veículos.
Pitman, que foi presidente da Novacap na administração Arruda, não esboça nenhum posicionamento contra esta explosão imobiliária da ocupação do solo de Brasília.

PPCUB e LUOS
Rodrigo Rollemberg tem se posicionado contra as propostas de Agnelo referente ao Projeto de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB. O PPCUB é mais uma atirada da especulação imobiliária, que objetiva adensar áreas do Plano Piloto, permitir a construção de hotéis e apart-hotéis na orla do Lago, criar uma super superquadra no Sudoeste, com 23 prédios; vender os terrenos de escolas no interior das superquadras à iniciativa privada, lotear a parte oeste do Eixo Monumental e transformar a quadra 900 da Asa Norte numa ampliação do Setor Hoteleiro.
Coma reação da sociedade de Brasília, em especial pela ação de movimentos como os Urbanistas de Brasília e Nós amamos Brasília, e a pronta ação do Ministério Público, a iniciativa de Agnelo, que poderia custar o título de patrimônio Mundial da Humanidade, está sobrestada. Mas a qualquer momento, nesta ou na próxima legislatura, os deputados distritais serão chamados ase posicionar sobre o tema. Dai a importância de uma boa escolha para deputado distrital, afinal, a palavra sobre o destino da cidade estará com eles.
Em relação aos demais temas que tratam da ocupação do solo do Distrito Federal, em especial os que poderão ser regulados pela Lei de Uso e Ocupação do Solo – LUOS (outro projeto que Agnelo enviou à CLDF e que prevê adensamento urbano em muitas RAs e mudanças de destinação de lotes, de uso residencial para comercial, por exemplo), pouco ou nada se ouviu do candidato socialista.
Observadores estão atentos, pois Rollemberg se alinhou a Rogério Rosso, do PSD. Rosso foi secretário de Desenvolvimento Econômico do governo de Joaquim Roriz. Parte das mudanças urbanas arquitetadas pelas empreiteiras tiveram início ainda na administração Roriz. Foi ele quem fez a primeira mudança de gabarito em Águas Claras. Pitman é muito próximo às empreiteiras e imobiliárias da Capital. Resta saber que peso o PSD terá na definição das propostas de governo da coligação PSB-PDT-SD-PSD.

Voz contrária
Dos principais candidatos ao GDF, o único que vem se colocando abertamente contrário aos interesses das empreiteiras, em especial a investida sobre as áreas verdes urbanas e rurais do Distrito Federal, é Antônio Carlos de Andrade. Toninho do Psol, como é conhecido, já afirmou que, se eleito, vai retirar todos os projetos enviados por Agnelo para revisão e debate com a sociedade. Para evitar que qualquer contaminação de interesses possa ocorrer nesta revisão, o Psol decidiu não aceitar nenhuma doação de campanha oriunda de pessoa jurídica. Desta forma, a pressão das empreiteiras deve ficar distante.
Todos estes temas norteiam os grandes interesses econômicos nas eleições do Distrito Federal. A dúvida é se eles chegarão ao cidadão comum, ao eleitor, que sofre diariamente com engarrafamentos e outros problemas decorrentes do crescimento desordenado da cidade.
A mídia tem papel pedagógico importante a desempenhar, mas, até agora, são as redes sociais quem tem puxado a temática. A palavra final está com sua excelência, o eleitor.
Nobre Chico, vejo novamente essa questão habitacional. Não sou um entusiasta dos interesses das construtoras e especuladores. No entanto Brasília precisa de oferta habitacional. Os preços absurdos foi decorrente de vários fatores, por exemplo, uma procura desenfreada,or conta da demanda, seja de investidores, especuladores e também por pessoas que aprovei ptaram para fugir do aluguel com a farta oferta de crédito. Temos hoje 2.5 milhões de habitantes, muitos vivendo em condições precárias dentro do DF, morando em barracos, kitnet (cabeça de porco), e o pior, a grande quantidade de brasilienses (ou trabalhadores do DF) que estão procurando o Entorno por conta da falta de oferta para algumas camadas da sociedade. Não se pode pensar Brasília como algo isolado, mas sim toda a sua região metropolitana, a conurbação que acontece a partir de Brasília.
Acho sim que se deve buscar mudanças e destinação de imóveis para as várias classes, seja baixa, média e alta. A não oferta é que está contribuindo ainda mais com as ilegalidades e irregularidades com as terras do Distrito Federal. Hoje o gargalo é a dificuldade de regularização dessas áreas pois descumpriram normas ambientais.
Não se pode fechar os olhos e não querer discutir essas demandas, Brasília precisa encontrar um equilíbrio.
CurtirCurtir
Caro João Silva
Projetos como os da OKlândia não são para os assalariados de baixa emédia renda. São projetos para aumentar ainda mais a especulação imobiliária e o custo de metro quadrado.
Brasília hoje, já vive uma bolha imobiliária. Muitos apartamentos em Águas Claras estão vazios em busca de inquilinos ou de compradores.
Não podemos descuidar do meio-ambiente.Veja o que acontece em São Paulo. ficou sem água. a cidade cresceu mais do que sua capacidade de se auto-abastecer.
CurtirCurtir
Impossível crer que os projetos urbanísticos apresentados no texto sejam para beneficiar pessoas de renda média e baixa. Ou alguém acha que deixarão tais pessoas morar no lado oeste do Eixo Monumental?
CurtirCurtir
É, Brasília precisa eleger um governador que não esteja comprometido com os interesses dos especuladores imobiliários e empreiteiros. Especuladores que fazem o que querem agora, como faziam em governos anteriores. Veja o que aconteceu com as terras da Santa Prisca. Da noite para o dia, literalmente da noite para o amanhecer, se conseguiu, e Deus sabe como, os 13 votos de distritais para incluir aquelas terras como área a ser implantada uma cidade. De rurais para urbanas. E não acredito que houve milagre dos Céus nessa conversão de distritais.
CurtirCurtir
O adensamento do solo urbano no DF só serve para o adensamento do recheio dos bolsos de algumas figuras e alguns empreiteiros.
CurtirCurtir
Republicou isso em Blog do Prof. Matheus.
CurtirCurtir
Primeiro vamos colocar transporte decente para o DF e entorno, ativar o VLP e as linhas de trem para o entorno sul, adequar de forma drásticas os terminais de ônibus do DF, todos sucateados, investir em fontes de energia limpas, gerar emprego nas RA’s, entre outras iniciativas.
CurtirCurtir
Tem toda razão, Renato. Com um transporte eficiente, podemos ter uma descentralização das áreas urbanas.
CurtirCurtir
Não afirmei que a Oklândia é destinada a possíveis pessoas de baixa renda. Falei sobre o problema das habitações como um todo. Entendo que a falta de oferta de áreas destinadas e programas sociais ineficientes contribuem com a desordem urbana e ainda provoca ainda mais a exclusão. Hoje Brasília tem uma periferia da periferia que se localiza no Entorno do Distrito Federal.
CurtirCurtir